JOÃO BARREIRO

Jayme Caetano Braun

 

João Barreiro...João Barreiro...

Velho pássaro bizarro

Que dum ranchito de barro,

Amassado com carinho,

Fizeste galpão e ninho

Na maior indiferença,

E nem pediste licença

Pra mim que sou teu vizinho!

 

Pois na cabeça de um poste,

Na entrada do parapeiro,

Te arranjaste bem a jeito

Erguendo teu rancho forte,

Meio de esguelha p’ra o norte

Porque és muito previdente...

Eu até fiquei contente;

Dizem que dás muita sorte!

 

Ranchito lindo esse teu

Que horas inteira contemplo,

Tem bem o feitio de um templo

Assim,  rústico e bagual,

Que o construtor mais genial

Por mais sorte e mais paciência

Leva toda uma existência

Mas nunca fará outro igual.

 

Por isso fico pensando

No poder do criador

Que dum pássaro cantor

Assim como tu, barreiro,

Fez o maior engenheiro

Que o céu abriga, chomico

Sem mais recursos que o bico

E o velho barro campeiro.

 

Quando piá fui meio diabo

Muito bichinho matei,

Mas sempre te respeitei

Sem saber qual a razão;

Talvez, por veneração

De piazote malcriado

Ao te ver sempre entonado

Nesse rancho de torrão.

 

Rancho bendito, esse teu,

Sempre um símbolo de paz

Portas abertas pra traz

Como ao dizer ao viajante:

Te apeia e chega pra diante

pois embora um passarinho

sei como é triste o caminho

dos guascas que vivem errante”.

 

E quando a barra do dia

No horizonte se desmancha,

Ao te ouvir pedindo cancha

Num grito de toda a goela

Sinto como  é rude e bela

A nossa velha querência

E como é penosa a ausência

Pra se viver longe dela.

 

Eu sinto inveja e não nego

Desse teu ninho barreado

Que ergueste desassombrado

Sobre o moerão da porteira.

Pois junto da companheira

Que te ajoujou na ternura

És a própria miniatura

Da fidalguia campeira.

 

Toda a mística da raça

Nesse barro sintetizas

E o Rio Grande simbolizas

Bombeando as várzeas desertas

Pois parece que acobertas

Nesse ranchito de luxo

O coração do gaúcho,

Sempre de portas abertas.