FIM DE SECA

Jayme Caetano Braun

 

No horizonte enfarruscado,

Onde uma barra levanta

O tempo abriu a garganta

E o silêncio de morte

Que, de repente caiu,

Só se escuta o assobio

Plangente, do vento Norte.

 

Há muitos e muitos meses

Vem durando a seca braba.

E nem ao menos, desaba,

Um chuvisqueiro ou garoa.

O calor desacorçoa,

Até parece mandinga,

Cortou-se d´agua a restinga,

Virou num lodo a lagoa.

 

Até o açude da frente

Está de taipa rachada.

E o resto de água embarrada

Que a boiada pisoteia

Parece sangueira feia

Que brotando de repente.

Se esparramasse, inda quente,

Na cancha de uma peleia.

 

Uma poeira colorada

Levanta da grama fina

E uma esquisita  neblina

Treme-treme no espaço.

Há um reflexo de aço

Corcoveando nas canhadas

E andam nuvens espiapadas

Como babas de mormaço.

 

Além, quebrando o silêncio,

Da embaciada paisagem.

Se apruma um bando selvagem

De quero-queros, gritando,

Como que, rememorando,

Num arremedo de luta,

O guasquear da chuva brita

Na sanga se desmanchando.

 

Junto ao oitão do meu rancho

Recostado num esteio,

Também espero e bombeio

Ao vento que se apresenta,

Sentindo, ao passo que aumenta,

Repontada na distância,

Aquela estranha fragrância

Que antecede uma tormenta.

 

Até o rebanho do fundo

Cruza em estranho rumor,

Buscando outro parador

No rumo do peladal.

Esse é o mais certo sinal,

Do temporal que pressinto,

Porque nasceu do instinto

Próprio de cada animal.

 

Meus trastes e meus arreios

Deixo ficar no relento.

Porque assim, não afugento,

Essa chuva que demora.

Convém que fique lá fora

Mesmo que tudo se molhe

Porque, se a gente recolhe,

A chuva se vai embora.

 

Como é lindo ver depois

O campo, quando se alaga,

Até o mormaço se apaga

Do ar xucro, purificado,

E o chão negro, pisoteado,

Se transforma, de vereda,

Num vasto lençol de seda.

 

Meio amarelo esverdeado.

Porém na alma gaudéria

Do índio que anda sozinho

Quando há seca de carinho

A vida é uma eterna espera

E jamais se recupera

Porque, quando a chuva vem,

Já não encontra ninguém,

O peito virou tapera.