Autoayme
Caetano Braun
Ah! Mate amargo bendito
que tenteio reverente,
o passado e o presente
passam ente mim,
contrito,
aqui matiando solito
junto do meu cusco baio,
quero sair mas não saio,
do peso desta agonia,
como Confúcio diria:
o mundo velho é um balaio...
E, dentro dele, eu me vejo,
no barro de uma mangueira,
quando apojava tambeira,
tirando leite pra queijo
e de falquejo em falquejo,
repisando trajetória,
trago vivos na memória
os arrepios que sentia,
quando ouvia e aprendia
os “causos” da nossa história.
Ah, Centauros que riscaram
as marcas da nossa linha,
desta pátria que era minha,
e os ancestrais nos legaram
e que agora hipotecaram,
por má-fé ou falta de senso!
olho o tempo, quieto, imenso,
tão presente e sempre antigo,
e passo a remoer comigo,
tudo o que sinto e que penso!
Meu cusco
de patas juntas,
debruçado no borralho,
como eu, joga baralho,
com recordações defuntas,
como a fazer-me perguntas,
silencioso, de mãos postas,
eu não posso dar-lhe as costas,
a um amigo, não se mente,
fico mateando, somente,
porque não tenho resposta,...
E aqui neste lusco-fusco,
de silêncio e de fumaça,
me enternece e me congraça,
a ternura do meu cusco,
e até compara-lo, busco,
no fundo do pensamento,
com as máguas e o sofrimento
dos humanos que se ofendem,
se matam, se desentendem,
por falta de sentimento.
E chego a entender, em parte,
a religião que comungo,
um pago, um cusco, um matungo,
uma china, um estandarte,
e por que o Rio Grande é parte
do Brasil, no todo imenso,
eu sou brasileiro, penso,
e, ao mesmo tempo, não sou,
ainda ninguém me explicou:
o pingo, a bandeira, o lenço...