Alma Pampa


Autor: Jayme Caetano Braun


Quem te batizou milonga,
Decerto foi algum monge
Que escutou de muito longe
O teu murmúrio de sanga
Ou quem sabe alguma changa,
Dormideira nos arreios
Dessas que fazem ponteios
Com unhas de japecanga

Ou quem sabe algum sorsal,
De topete colorado
Num prelúdio abarbarado
Das canas do taquaral
Talvez quem sabe um bagual
Corcoveando num repecho
Floreando as cordas do queixo
Nas pontas do pastiçal

Brasileira, castelhana,
Milonga ronco de mate
Tu nasceste do embate
Da velha saga pampeana
Espanhola, lusitana,
Entre patriadas e domas
Sem divisas, sem diplomas,
Cursando o mesmo dialeto
Porque o vento analfabeto
Fala em todos idiomas

Quem sabe talvez a lança,
Riscando a primeira linha
Quando a adaga se embainha,
Cadenciava uma romanza
Ou talvez a vaca mansa,
Dentro da várzea perdida
Na ternura enrouquecida,
Feito instinto e lamento
Anunciando o nascimento
Da cria recém lambida

Por isso em qualquer fronteira,
No esboço da lonjura
És a mais linda mistura
Da nobre estirpe campeira
Fidalga e aventureira,
Com geografia na cara
Passaporte tapejara,
No caminho dos andejos
Reculutando solfejos
Que uma linha não separa

Alma de pampa e semente
Que nasceu nos dois costados
Herança dos mal domados
Que formaram nossa gente
O passado e o presente
E o futuro dimensionas
Nas primas e nas bordonas
Do garrão do continente