UM HOMEM DE FERRO
Ibani Jorge Bicca
Toca o fole,
bate o ferro,
que tem cor de por-do-sol.
O ferreiro vai batendo,
batendo na sorte maula,
que não lhe deu outra escolha,
pois foi criado ferreiro,
com ferro no coração.
Que ironia Senhor,
é a vida deste pobre!
Bate o ferro por uns cobres,
que não cobrem seu sustento.
A mulher lava pra fora
e planta horta quando dá.
O piá faz changa no povo,
pra comprar tamanco novo,
e ir na escola estudar.
Ferra a roda da carreta,
bate a enxada e o machado,
bate a ponteira do arado
que de lavrar se gastou.
Solda o freio do campeiro
que na doma se quebrou,
e faz a trempe de ferro
que o patrão lhe encomendou.
Passa o dia e chega a noite
e não tem hora pra parar,
pois prometeu terminar
o serviço que assumiu.
E só termina a jornada
depois que a lua subiu.
Cansado deita na sala
e se cobre com o velho pala,
pois não deseja acordar,
a china que já dormiu.
O sono lhe traz os sonhos...
Que sonharia o ferreiro?
Será que sonha ser rico
e poderoso estancieiro?
Ou um comerciante abastado,
contando muito dinheiro?
Pois seus sonhos são
humildes,
quer pouco pra ser feliz.:
Sonha com um fole novo,
que o velho já está furado
e com três barras de ferro,
pra fabricar dois arados.
Canta o galo no poleiro,
mas não acorda o ferreiro,
que há muito já está mateando,
e solito matutando,
como vai fazer a marca,
que o coronel desenhou.
Larga a cuia, Acende a forja
e recomeça a labuta.
É mais um dia de luta
em honra a Nosso Senhor.
- Guri me traz mais carvão.
- Depois me alcança a
marreta,
que o ferro já está no ponto.
"O
velho galpão pendido,
que agasalha a ferraria,
o fole, a forja, a bigorna,
a talhadeira, a tenaz.
A marreta que sobe e desce,
moldando o ferro aquecido;"
Este é um retrato querido,
que mora em minha lembrança,
desde os tempos de criança.
E aquele homem de ferro,
com orgulho eu repito:
Este ferreiro bendito,
que da minha idéia não sai,
pois não consigo esquecer...
Sinto-me honrado em dizer,
era de fato...meu pai!