Das Sombras de Um Galpão Velho

Seival da Poesia Gaúcha

2º Lugar Intérprete

Autor: Gujo Teixeira

Declamador: Luciano Salerno

Amadrinhador: Denis da Silva Magalhães

 

Ponteou de longe o agosto

pras bandas dessa fronteira

trazendo um tempo escuro

sem estrelas madrugueiras.

E nuvens do mesmo pêlo

como se fosse uma tropa

tocada sem sinuelo.

Veio de longe esse agosto

seguindo o mesmo rastro

das cicatrizes que a chuva

deixou por sob estes pastos.

 

Sobrou tempo pra o machado

- contra o angico no chão –

campear um bom pai-de-fogo

pras horas de precisão.

 

No galpão as labaredas...

fogueando velhas lembranças

comiam o cerne do angico

com suas línguas em danças...

e contra a parede, sombreava

um vulto feito um ginete

arreios, bancos, aperos

e o vazio de um cavalete.

 

Me lembro se fosse hoje

quando foi Juca Mulato;

Enforquilhou-se num upa:

arreios no mouro-pampa

uma mala de garupa...

poncho emalado, cambona,

o doze braças, um par de esporas,

sua humildade e cordeona.

 

Partiu como se voltasse

nem se despediu dos seus.

Pegou o doradilho de tiro

nos disse apenas: adeus...

ralhou com o baio colera

e só olhou pra estância

quando apeiou na porteira.

 

Ao longe ouviam-se gritos

como ponteasse uma tropa

talvez a dos seus recuerdos

das suas saudades e medos.

Que a gente por onde for...

num ofício tropeador

tem que levá-las por diante...

mesmo que sejam distantes

as léguas do corredor.

 

Nunca mais se soube histórias

nem um “cuento”, nem uma prosa

que falasse do velhito.

 

Quem sabe, morreu solito

changueando uns pila miúdo

por estes bretes povoeiros

que se perdem pelo mundo.

 

Quem sabe já estará noutro

longe das lidas e potros...

onde a vida valha mais

do que a ascensão do dinheiro;

Um lugar onde parceiros

gerveiem” com a mesma erva...

pois o destino reserva

um lugar bueno aos campeiros.

 

Quem sabe por ser gaudério

- e sempre quis ser assim –

pegô” o rumo de uma estrada

dessas de léguas cansadas

que parecem não ter fim.

 

E hoje, entre um mate e outro

longe de lidas e potros

lembrei deste velho amigo

que parecia estar perto

mateando junto comigo.

 

Sua presença “as vezgaviona...

quando no rádio de pilhas...

escuto o florear d’uma cordeona.

 

- Mas bota agosto gelado...

de desabar o poncho negro.

O fogo segue comendo

o cerne do velho angico...

e incendiando a escuridão

sombreava minhas lembranças

na parede do galpão...

 

Nem sei porque me lembrei

do amigo Juca, se há tempo

olhou o rumo dos ventos

enforquilhou-se e partiu...

mas hoje o fogo clareando

aos poucos fui recordando

e aos poucos foi sombreando

um cavalete vazio!!