APURO NO FANDANGO

Cabeleira

 

Peço licença aos senhores

P’ra conta um fato engraçado,

Que deu-se a tempo passado

Numa viagem que eu fiz.

Viagem ruim barbaridade,

Mas podem crer, é verdade...

O que este guasca diz.

 

Este fato aconteceu

prás bandas da fronteira

Passando pela porteira

De um campo naquela zona,

Num lugar mesmo bonito,

Olhei direto um ranchito

E ouvi um toque de cordeona.

 

Eu não sabia, mas era,

Ali um salão de dança,

Dançava ali a vizinhança

De todo aquele lugar.

Eu lá ninguém conhecia,

Mas eu gosto de folia,

E resolvi também dançar.

 

Era uma noite bonita,

Já no findar de um domingo.

Meti as esporas no pingo.

Fui num trotito assobiando

No tal de salão cheguei,

Na frente a perna boleei

E o pingo fui amarrando.

 

Desamassei a bombacha

E rumei direto á porta.

Vi um taura de cara torta

Que me olhando pegou ri.

Depois disse: É bom voltar,

Nem inventa de chegar

Que é muito melhor pra ti.

 

Naquele instante, senti,

Que a espora tiniu na bota,

Ele disse: Índio da grota,

Não entra aqui nesta sala.

Chegou me granzi o bigode

Dei um bufo que nem bode

E atirei pra trás o pala.

 

Quebrei meu chapéu pra nuca

E falei: “Eu te arrebento”,

E entrei salão a dentro,

Gritando “gaiteiro toca”.

E dancei xote largado,

Mas então, bem agarrado,

Na cintura da chinoca.

 

Dali a pouco levantaou-se

Um quéra deste tamanho.

Lá no meio do rebanho

Deu um pulo e disse assim,

“Saiam pros lados minha gente,

Quero ver quem é o valente

Que entrou sem pedir pra mim”.

 

Quando vi que era comigo,

Me fui pro canto e gritei...

pois fui eu mesmo que entrei”,

não precisa bater trela.

Ele quis levantar o braço.

Larguei por cima um pranchaço

Que chegou estralar a costela.

 

Foi aquele reboliço

Correu todo o chinaredo,

Mas eu sou quéra sem medo,

Me encarreguei do barbado

E só, me vi no apuro,

Sem lampião, no escuro,

Só facão por todo lado.

 

Foi chegando os deixa disso

Parem, chega, é gente amiga,

Foram apartando a briga

Eu fiquei quieto, era carancho.

Mas se mingúem apartasse,

Embora um mês eu brigasse,

Ficava dono do rancho.

 

Hoje em dia, quando conto,

Poucos crêem neste causo,

E só me dão o aplauso,

Depois que explicação.

“Foi sonho”. Eu tinha dormido,

e da cama eu tinha caído,

de travesseiro na mão.