ALMA XUCRA

 Gonçalves Chaves Calixto (Cabeleira)

 

Através de versos xucros

Da minha xucra existência

Eu mando á toda querência

E ao rancho pobre ou de luxo,

Meu verso muito gaúcho

De pura essência campeira,

Bradando com altivismo,

O mesmo amor e afago,

Aos quatro cantos do pago,

Seja na serra ou fronteira.

 

Eu sou que nem quero-quero

Guardião da várzea e coxilhas,

O sangue dos Farroupilhas

Eu sinto correr na veia

Sou potro que corcoveia

Por não querer ser domado

Eu fiquei como semente,

P’ra contar na poesia

A nobreza e valentia

Dos nossos antepassados.

 

Eu sou gaúcho também

Tal e qual meus ancestrais,

Tenho os mesmos ideais

Do velho e guapo xirú,

Igual Sepé Tiarajú

Também me criei selvagem,

Pois desde o primeiro instante

Que enxerguei o Universo,

Eu chorei rimando um verso,

Rendendo ao pampa, homenagem.

 

Sou o peazito que um dia

Deixou o rancho em Santiago,

Lá nas fronteiras do pago,

Perto do solo Argentino.

Me criei mui teatino,

Tão longe do meu rincão,

Deixei os campos do pampa

Para viver na cidade

Pra não morrer de saudade

Eu vivo p’ra tradição.

 

Eu sou o potro aporreado

Que não aceita o arreio

Solto de patas, sem freio,

Me criei sempre liberto,

Como touro em campo aberto,

Eu me criei mem assim!

Eu sinto a alma vibrando

Pelas proesas do guapo,

Eu tenho o sangue Farrapo

Fervendo dentro de mim.

 

Eu só tenho um sentimento

Dentro do peito escondido,

Por não poder ter vivido

Nos tempos que já passaram,

P’ra ajudar os que tombaram

Lutando com todo afinco.

Queria ter o prazer

De conhecer pessoalmente

O taura guapo e valente

Por volta de “trinta e cinco”.

 

Sou xucro por natureza,

Pois sou assim desde a infância

Uso com muita arrogância

Meu lenço preso ao pescoço

Me orgulho porque sou grosso,

Como diz o “cala fina”

Que não entende as belezas

Que nesta pampa se encerra

Que é as coisa da nossa terra

Que a tradição nos ensina.

 

Sou o resto de uma raça

Moldado no mesmo “cerno

Eu sou o frio do inverno

Soprando forte o Minuano,

Eu sou o solo pampeano,

Que me deu soberania

Para poder todo instante

Fazer versos com veemência,

Saudando minha querência

Nas rimas da poesia.

 

Sou a própria ALMA XUCRA

Pois tenho a estirpe charrua,

Sou índio da idéia crua

Que erra e não se arrepende

E aquele que me compreende,

Me aceita como eu sou.

Sou como o tiro de laço

Zunindo ao sopro dos ventos,

Eu sou um dos quatro tentos

Que a natureza trançou.

 

Eu sou a água da sanga

Que mata a sede do “Qüéra”.

Eu sou rancho na tapera

Marcando a própria existência,

Que nunca muda a aparência

Porque habitado já foi,

Eu sou o índio proscrito

Que errou n’lguma façanha

E vim rebuscar na canha

Pedindo que Deus perdoe.

 

Eu sou muito agradecido

Ao patrão velho do céu,

Ao qual eu tiro o chapéu

Com muito gosto e prazer,

Por ter me feito nascer

Aqui no torrão caudilho.

A min’alma se emociona

De tanto amor que se expande,

Eu te agradeço Rio Grande,

Me orgulho por ser teu filho.

 

Eu teria muita cousa

P’ falar sobre minha terra

Mas a emoção que se encerra

Me esmaga dentro do peito,

Quero falar...não tem jeito!

Então eu termino assim...

O coração pinoteando,

Manoteando de contente:

“Eu sou gaúcho minha gente!

Só isto basta pra mim”.