LENÇO COLORADO

Glaucus Saraiva

 

Pedaço de sol poente

no meu pescoço amarrado!

Velho lenço colorado

batido pelo minuano,

és um soluço de pano

que me brota da garganta.

Em meu peito se agiganta

um recalcado gemido

por te enxergar decaído

na paisagem do presente,

como um pássaro doente

no seu último estertor

como as asas de um condor

que envelheceu de repente.

E nessa tristeza ingente,

como um gaúcho não chora,

faço soluçar a espora

pra traduzir minha dor.

 

Desde a velha "Maraghat"

- nas plagas do antigo Egito -

vinhas coloreando gritos

de liberdade e de guerra.

Voando de terra em terra,

cabresteado à sina estranha.

Te entreveraste na Espanha

entre mouros e cristãos.

E te arrinconaste, então,

pela "Maragateria".

Foi de lá que a bizarria

de um destino oculto e vago

te arrastou para este pago

de virgem terra pampeira.

Chegaste - Oh! águia altaneira -

pressagiando pugilatos

com os primeiros maragatos

que acamparam na fronteira.

 

E foi na aurora do pago,

como rubro sol nascente

que inspiraste à nossa gente

sua guerreira trajetória.

Foste o topete da História

da gauchada andarilha,

que nas peleias caudilhas

atado à lança guerreira,

te ostentou como bandeira

para pelear nas coxilhas.

 

Vieste de "Trinta e Cinco",

peleaste em "Noventa e Três";

te insurgiste em "Vinte e Três"

guerreando até "Vinte e Quatro"...

e foi neste anfiteatro

que um encantamento bruxo

te acolherou ao gaúcho,

unindo, pra sempre, os dois...

E juntos foram, depois,

revivendo monarqueadas,

às últimas arrancadas

de "Trinta" e de "Trinta e Dois".

 

Nem a geada do tempo

desbotou tua cor vermelha

que de há séculos espelha

o cerne macho da terra.

Porém, os gritos da terra,

eivados de liberdade,

que no tropel das idades

retumbaram neste pago,

se transformam num vago

prelúdio de funeral.

 

Mas no momento fatal

em que - meu pano lendário -

fores o lenço mortuário

com que o gaúcho deposto

esconde seu próprio rosto

no caixão do esquecimento,

não soltarei um lamento,

pedaço de sol desfeito...

Mas te arrancarei do peito.

-Óh! gonfalão sacrossanto...

E pra não chorar, no entanto,

frente aos despojos da raça,

eu te farei de mordaça

para sufocar meu pranto!