DAS RUÍNAS DO SALADEIRO

 Estanislau Robalo

 

À Noite vem os lamentos

Dentre meio aos escombros

Das almas fazendo assombros

Nas ruínas do saladeiro

Talvez, de algum peão campeiro

Remoendo os seus tormentos

 

Perdidas, buscando a luz

Na saudade e nostalgia

Lamuriando em noite fria

Com as marcas do passado

Carregando o seu pecado

Conforme o peso da cruz

 

É algum capataz de tropa

Que sai por aí vagando

Sua lamúrias tropeando

Como o gado, aos ingleses

Que mataram nossas reses

Pra vender charque à Oropa.

 

E se torram enrijecidas

Numa convivência bruta

Na tradição e na luta

Como foram esses gaudérios

Outrora, mulatos sérios

Hoje vagam sem guaridas.

 

Essas almas desgarradas

Que vagueiam sem preguiça

Conhecem bem a injustiça

E a vivência sem direitos

Afúria dos preconceitos

E o vazio das invernadas.

 

Conhecem mais que ninguém

A história desta querência

A negação da clemência

Até mesmo ao boi de canga

Saindo da última changa

Pra charque virar também.

 

A relação de poder

Que fez do pobre mais pobre

O rico chamar-se nobre

Modificando o conceito

E aumentando o desrespeito

Sempre na busca do ter

 

Que sabe se o saladeiro

Que a essas almas congrega

Alma de boi também medra

No saladeiro em ruínas

Possa ainda abrir as retinas

De muito peão campeiro.

 

Pois há uma eterna charqueada

Que vai somando na tarca

Ë o homem que bota a marca

Pra marcar o semelhante

E leva a tropa por diante

Como se leva a boiada.

 

Mas um dia, Deus permita

Que almas de bicho e gente

Num missal irreverente

Decretem o fim dos abusos

E a retirada de intrusos

Desta querência bendita.

 

Que a mancha rubra deixada

No sangrador da coxilha

Demarque uma nova trilha

Pra um mundo mais consciente

E as almas que sigam em frente

Felizes nesta jornada!