A MORTE DO VELHO VICÊNCIO
Dimas Costa
Morreu o velho Vicêncio
que era o peão mais antigo
da fazendo do Macedo.
Já tinha 90 anos
mas era o peão mais “Caxias”,
que mal o romper do dia,
se levantava bem cedo!
Era um guri que nem eu
o velho Vicêncio Rita
quando chegou lá nos pagos
do RINCÃO DA NACAUÍTA...
Foi logo aceito na Estância
como peão mandalete,
porque...ao Patrão veio um bilhete
de um doutor lá da cidade.
Era um órfão, assim dizia:
um GUACHO, pra ser exato,
um FILHO FEITO NO MATO,
na expressão da verdade...
“Um filho de mãe solteira”,
“um
produto de caprichos”,
falavam nos seus cochichos,
as velhas alcoviteiras.
“Era um filho de macega”
“um
produto de pecados”
“Dos coronéis, Deputados”...
--Eta,
língua cortadeira:
Mas, Vicêncio,
mesmo nascido
no meio do POVAREDO,
foi se adaptando mui cedo
nas lidas da gauchada.
E com o patrão dando duro,
se entregou a profissão:
de operário, de peão,
de ”empregado de campereadas”.
Um petiço foi-lhe dado
e o Capataz, seu Justino,
se compadeceu do destino
desse guri deserdado.
E o Vicêncio
foi crescendo,
faz-se moço... bom campeiro,
alegre, sempre lampeiro,
por isso mui estimado.
Tocava violão sentado
que até a noite chorava.
Quando a lua escutava
a voz do moço Vicêncio,
nas plagas do mundaréu,
nas várzeas do campo em flor,
a voz do moço cantor
era escutada em silêncio.
Um dia veio o amor,
na figura de uma prenda,
que apareceu na Fazenda
de empregada do patrão.
E não foi longe o namoro
nem se prolongou o noivado,
e logo estava casado
Vicêncio, o amado peão.
Foram anos de união
na paz de um lar bem gaúcho,
onde a ternura sem luxo
era a luz da honradez.
Paz e hospitalidade,
bondade e simpatia,
era o que de melhor existia,
naquele rancho de Deus.
Um dia vaio a parteira
naquela tradicional corrida,
e um guri encheu a vida
a vida daquele
lar.
Foi tão grande a alegria
que chorava o mundo inteiro,
até o chão do terreiro
diz que se viu chorando.
Respingos mancharam a terra
num salpicar misterioso.
O tempo não era chuvoso
tinha um sol forte e bem quente.
E o mistério desses salpicos,
no terreiro da morada
ficou na alma assombrada
daquela simplória gente.
Morreu o velho Vicêncio
passo a passo a lei Suprema
conduz na vida os destinos.
Leva rebentos meninos,
conserva a longa existência.
E uma família, as vezes,
marca a sua memória,
num velho com a sua história...
num moço... com a descendência.
O tempo se foi correndo
uma carreira infinita
e aquela união bendita
que o destino um
dia fez;
depois de muitos anos,
daquele amor venturoso,
deixou um velho choroso
magoando a sua viuvez.
E do filho, também já morto,
as origens conservando,
Vicêncio ficou criando
um neto- o seu herdeiro.
este, bem como o velho,
apegado ao gauchismo,
conservava o nativismo,
Peão...GAÚCHO... campeiro!
Morreu o velho Vicêncio.
Foi um enterro modesto,
Um carretão e de acabresto,
o cavalo do Vicêncio.
No cemitério de campanha,
levado pela peonada,
na sua última morada,
ficou dormindo um silêncio.
Era a terra que cobriu o
velho
ficou toda salpicada
pela lágrima derramada
do neto que ali ficou.
Verdade:
Pois o velho gaúcho Vicêncio,
de quem contei a história,
ficou sempre em minha memória,
Porque: Ele era o meu AVÔ!