A LIÇÃO DO GURI
Dimas Costa
Pequeno, muito pequeno
recém ensaiando os passos,
mas já trazendo nos braços
a fibra chucra herança
o piá bem demonstrava
o quanto vale a lição
que a crioula tradição
pode dar para a criança.
Era um guri bem criado,
pois o pai sendo gaúcho,
não lhe dava certo luxo,
e muito mimo demais
Mas pequeno, bem pequeno,
melhor que grande sabia
até que ponto devia
o respeito para os pais.
Cada vez que o pai chagava,
da sua lida camareira,
lá estava, na porteira,
o filho sempre a esperar.
E recebia do velho
um terno e apertado abraço,
unindo um profundo laço
aquele amor singular.
Inocente, pequenito,
já sabia inchar o peito,
e tinha, o guri, no jeito,
arrancos de valentia.
Lá por causa de um brinquedo,
com outras crias da casa,
o guri virava brasa,
e era aquela estripulias.
Mas quando o pai chamava,
para passar-lhe um carão,
subia-lhe um vermelhão
pela face transformada.
E ficava olhando o pai,
bufando, quieto, calado,
meio escarvando, apotrado,
mas não respondia nada.
Depois, saía obediente
para cumprir o castigo.
Sabia: o pai era amigo,
embora assim, meio austero
e ele bem compreendia
que lhe faltava o direito.
Por isso tinha respeito
quando o pai era severo.
Certo dia, este piazito,
por arrancos de coragem,
andou fazendo bobagem
e o pai, perdendo a estribeira,
embora nunca o fizesse
agarrou-lhe pelo braço
e quis lhe dar um laçaço,
empunhando uma soiteira.
Mas o guri o enfrentou
como um macho de verdade.
E apesar de tenra idade,
teve a coragem tamanha
de dizer ao próprio pai
-no olhar intenso brilho -
Olha pai que eu sou teu filho,
mas gaúcho não apanha!
O velho largou o relho
abraçando-o comovido
-filho, meu filho querido,
eu perdôo a tua arte!
Pois me deste uma lição,
com tamanha valentia,
que há muito não recebia:
Num gaúcho....não se bate!