VELHA CORDEONA
Derly
Silva
A cordeona
vai se abrindo
Nas munhecas do gaiteiro
E eu abrindo meu peito
Que nem galo no terreiro
Pois com o toque da cordeona
Eu fico mais caborteiro
E do potreiro da memória
Só sai verso galponeiro.
Gaiteiro puxa essa gaita
Faça o que este peão diz
Pois essa melodia xucra
Me torna bem mais feliz
Amadrinhando de perto
O verso triste que eu fiz
Tu gaita, espanta a saudade
Da prenda que não me quis.
O gaúcho ama mesmo
Se por alguém se apaixona
Mas se é comprometida
Que não pode ser sua dona
Só tem consolo contando
Com quem nunca lhe abandona
A mais fiel companheira
A sua velha cordeona.
Se não fosse a velha gaita
Nos tempos de antigamente
Não se criava o fandango
Para alegrar nossa gente
Nem surgia o trovador
Com seu verso no repente
E o poeta vazendo
versos
Que hão de ficar pra semente.
Foste tu, velha cordeona,
De botão ou pianada
Que acordou sem serenata
A prenda de madrugada
Mas se o velho era aporreado
A coisa saia errada
E quantas vezes sem ter culpa
A cordeona
foi cortada.
Eu lembro de certa feita
Tava mesmo o tempo feio
O trinta e oito berrava
E a adaga dava rodeio
Lá pelas tantas gritaram
Nem sei de onde a voz veio
Dizendo assim: A lá puxa
Racharam a gaita no meio.
Adaga, mango, balaço
Um baita dum estrupício
E eu fui me recostando
Pois pelear
não é meu vício
E o coitado do gaiteiro
O preto velho Aparício
Se
encontrava mais nervoso
Do que anão em comício.
Nem só por isso, cordeona,
Mas é por isso também
Que á considero uma relíquia
E aprendi querer-te bem
Um dia tu vais comigo
Se Deus achar que convém
Pra tocar chote
e rancheira
Lá nos fandangos do além.