CLOPAS DE CHIMARREAR SOLITO
Cristiano Ferreira Pereira
O
tempo enfrena um dia lobuno
e a
água, mansamente, beija as flexilhas,
dando
de beber ao solo pampeano.
Me
“quedo”, só, no galpão,
a
cevar meu mate,
a
olhar pra dentro
e
estradear lonjuras na minha memória,
que
a geada dos anos,
groseou ... despacito.
É
assim...
ao
matear de mano com a solidão,
que
um braseiro com o seu calor
se
faz multidão...
...
e o pai-de-fogo - mui terno - me fita,
e
as labaredas ... me estendem as mãos.
Bombeio
a chuva lá fora,
acomodado
num cepo;
a
fumaça do angico
rondando
os meus pensamentos,
e o
pontear xucro do vento,
talareando
no oitão...
O
calor da seiva bugra
vai
temperando o tutano
que
o tempo velho forjou!
Pego
a cuia ... e a água da cambona,
lentamente,
acaricia o verdor da “yerba”
-
as verdes coxilhas do pampa,
a
chuva larga lhes beija -
e
um “relampo”, campo afora,
é
sinuêlo pra memória,
que
no mesmo tranco das mansas...
despacito,
vêm chegando!
É
nesta hora...
que
relembro os bois,
que
muito sovaram conjuntas
no
compasso do meu picanear...
...guri;
reponto
a tropa de osso
-
que há muito anda esquecida -
e
meu flete de taquara
-
“Oigalê, pingaço bueno!”
o
primeiro da minha encilha,
domado
pelo meu velho.
A lo largo...
o
guri tornou-se homem,
e o
homem, com sua fibra,
despacito,
fez-se velho,
guasqueado
pelas lições da vida!
Sim!...
Solito,
a cuia entre as mãos,
bombeio
o findar do inverno
com
as brisas de setembro
- a
olfatear primavera -
e
faço d’alma a quimera
para
ajoujar esperanças
que
retemperam o meu cerne.
De
já hoje...
o
tempo amadureceu o meu pensar,
já
não tenho a fibra daquele qüera
mas,
vejo o mundo com a ternura
do
meu olhar de guri.
E,
é por isso, que
me
“quedo” e ... penso,
penso
... enquanto chimarreio,
em
tudo o que se perdeu a la cria
neste
mundo sem porteira:
cambiaram-se
as tropas largas
por
roncos de motores
perdidos
na polvadeira;
já
não há gado de osso;
agonizam
as juntas de bois;
dos
bons fletes de taquara
só
há contos pros guris,
que
vão perdendo aos pouquitos
a essência
dessa planura
nos
sonhos que têm em si!
A la maula!...
Num
instante a “yerba” se faz caúna!
Não
vou prever o futuro
que
dispara com os arreios,
a
apartar dos rodeios
parados
sobre as coxilhas,
o
atavísmo terrunho
que
apresilha o qüera ao campo;
nem
vou falar da cidade
que
fere os sonhos com o freio,
a
cabrestear devaneios,
erguendo
o catre derradeiro
pra
alma dos campechanos!
Por
isso!...
Que
nestas horas em que a chuva
mata
a sede do pampa,
me
aparto pro galpão...
...
a olhar pra dentro,
a
estradear lonjuras...
e o
tropel silente de minhas memórias,
vem
aflorar em coplas,
a
cevar mensagens
e
cambonear lembranças
num
chimarrear solito!
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Poema
dedicado a Delci José Oliveira
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Me “quedo” : Me paro, fico. Termo fronteiriço.
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Poema gentilmente cedido pelo autor. (Poesia do 4º Seival da Poesia Gaúcha)