ROMANCE DE ESTRADA E TEMPO
Colmar Pereira Duarte
Como rugas na testa da coxilha,
vão-se estendendo as “huellas” paralelas.
Ocultando, entre cardos e flexilhas,
o que a vida escreveu
ao longo delas.
Quanta interrogação!
Quanta surpresa!
Quanta alegria... e também,
quanta tristeza eu vi chegar
por essa mesma estrada
traço de união entre o meu faz-de-conta
e o mundo dos andantes e tropeiros.
Quando guri,
meus olhos noveleiros
sempre vigiando a estrada todo dia,
fui sentinela ativa deste posto.
E, ao primeiro sinal,
dava o alerta: vem gente! ...imaginando
quem seria...
Talvez aquele de língua sovada,
que trazia notícias de outras terras;
que falava de horrores e de guerras
onde os homens se matavam como
feras,
na chacina dos campos de batalha!
Mortos com honra... sem cruz e sem
mortalha;
Pátrias sem paz... com glórias e taperas.
Ou - quem sabe - o Domador de Potros
que aqui chegara com baguais por
diante
(e o toque do cincerro, qual magia,
tornou palpável minha fantasia
e me fez domador, naquele instante...
Pois, ao vê-lo afastar-se, no outro dia,
me pareceu que era eu quem ia
com meus baguais de sonhos, em
reponte...)
Ou seria o Ligeira da Sesteada?
Tão faminto... tão quieto e maltrapilho...
Ou o Mascate, de língua enredada,
que trazia no lombo de um tordilho
uma carga de vidros e fazendas?
Meia légua, do rancho até a porteira,
mas, por mais longa
a trilha que o destino nos reservou,
marcada com sua poeira
ficou ali a primeira despedida;
À espera que o nosso esquecimento,
com lágrimas de chuva e voz de vento,
fosse apagando as marcas da partida.
O rancho é diferente,
está mudado;
Mas a estrada está igual, não mudou
nada.
Às vezes, quando estou abichornado
me parece que enxergo,
no fim da estrada,
ressurgindo das névoas do passado,
aqueles que daqui foram embora
para jamais voltar.
O Forasteiro, o Domador de Potros,
o Mascate, o Ligeira...
E tantos outros
foram deixando em mim sua influência
e me fizeram sonhador
e triste.
E essa ilusão,
que ainda hoje insiste em relembrar
meus tempos de criança,
me faz pensar que tudo se repete;
E, a cada instante, a vida nos promete
caminhos de ilusão
e de esperança.
Nada disso passou,
nada morreu.
A vida continua sempre linda.
A estrada do meu rancho
é a mesma ainda.
Tudo é igual!
Quem mudou fui eu...