O CICLO DA ESPERA

Colmar Duarte

 

Olhos longe, no verde das coxilhas,

a espera pelo filho a cada tarde,

como se ele voltasse das guerrilhas

e não de seu ofício de campeiro.

A comida do fogo, um mate pronto.

No peito, a angústia... a incerteza

de quem carrega a sina de esperar.

 

Tanto esperara pelo pai, outrora,

que se fora pelear em uma escolta.

Até que o vira, então, chegar de volta

e ser posto sem vida sobre a mesa.

Quando em silêncio foi levado embora,

ficaram o desespero e a certeza

que em vão teria sempre de esperar.

 

Passou o tempo....

e seus irmãos se alçaram,

a barba rala mal sombreando a cara,

a desbravar caminhos desta terra.

Riscando o ar com lanças de taquara,

ansiando a paz, foram fazendo a guerra.

 

E os esperou em vão...

nunca voltaram.

Talvez apodrecessem sobre os pastos.

entre lanças quebradas e bandeiras.

sem consolo de prantos ou saudade.

Sem nem saber que ás vezes a verdade

morre de olhos vendados e sem glória,

pois é o que mata quem escreve a história!

 

E, no ciclo dos dias e dos anos,

de outra feita trouxeram seu marido

atravessado sobre o malacara,

ensangüentando pilchas e arreios,

morto de uma bolcada num rodeio.

 

Só lhe sobrara o filho, seu arrimo,

para voltar a cada entardecer.

A panela no fogo, o mate pronto.

Olhos longe, no verde das coxilhas

 

e a angustiante sina de esperar...

Hoje, porém, passados tantos anos,

o piá de outrora é um guapo calejado

que a vida cascoteou em suas andanças.

Cresceu domando a sorte, na estância,

fazendo changas pra ganhar uns cobres

para o sustento desse rancho pobre,

onde atrelou bem cedo seu destino.

 

Cestamente, ao voltar, neste sol-pôr,

de custar a crer no que o espera.

Nenhum sinal... silêncio de tapera...

o fogão apagado...a porta aberta...

Sobre o catre de couro recostada,

a que fui filha, irmã, esposa e mãe

daqueles que do rancho viu partir

para esperar em cada entardecer,

não esperou o filho...Pra morrer.