Cheretã

                                                                                  Colmar Pereira Duarte

                                                                                 

Se a terra tinha dono

E se foi dito ou não, por Tiarajú,

A quem bania os índios

Pra dividir a posse desse chão.

Que importa a tradução desse seu grito?

Importa o grito contra a opressão!

 

“Eram armas de Castela

Que vinham do mar de além.

De Portugal também vinham,

Dizendo, por nosso bem;

Mas quem faz gemer a terra

Em nome da paz não vem.”

 

Há feridas que o tempo cicatriza,

Outras, que a história enterra, esconde, apaga.

Quem, por não aceitar outro destino

Foi condenado à morte e ao extermínio

Sob o fogo de canhões, morreu sem glória;

Pois é quem mata quem escreve a história!

 

E, hoje, pergunta o menos avisado:

- Qual o legado Guarani que existe

Incorporado à nossa cultura?

- O quê, além das ruínas missioneiras,

Sobrou para lembrar esses nativos

Que ousaram enfrentar duas bandeiras

Querendo a terra que entendiam sua.

Que mais restou para lembrar o idioma

- Que é voz da Pátria e sua identidade

A não ser nome de arroios e de rios

Batizados por eles, não cambiados

Pelos nomes de Santos como tantos?

Uruguai, Ibicuí, Iñhoporã,

Quaraí, Japejú, Ibirocai,

Apesar do homem branco e dos maus tratos,

São artérias na carne desta terra,

Mesclando com as águas das nascentes

O sangue do holocausto de inocentes

E as lágrimas dos órfãos dessa guerra!

 

“...Eram armas de Castela

Que vinham do mar de além...”

 

traziam decidido

O que pertencia a quem.

Afinal, nas caravelas

Vinha a civilização.

Nativos e suas culturas

Não importavam a ninguém.

 

“...De Portugal também vinham

Dizendo por nosso bem...”

 

Bacamartes e canhões

Davam o inferno pros índios,

Enquanto as duas coroas

Mediavam o paraíso

- Troféu aos sábios, que sabem

Que navegar é preciso.

 

Sepé peleou contra isso

Viu seu povo dizimado

Submetido ao martírio,

Nos canhões de Gomes Freire,

Na espada de Valdelírios.

 

Quem viveu de perto a história

Em louvor à sua memória,

Fez santo o índio guerreiro.

Seu sangue corre altaneiro

Nas veias da gauchada;

Na risada escancarada,

Nos gritos de rebeldia;

No sopro da ventania

Que é ânsia de liberdade;

Na herança dessa etnia

Que miscigenou a raça;

Na erva-mate, que passa,

De mão em mão, amizade;

Sinal de hospitalidade.

Por onde o gaúcho ande

- Pelo guarani legado

Hoje é símbolo, estampado

Na bandeira do Rio Grande!

 

Glória aos que, mesmo sem armas,

Desfraldam sua bandeira;

Trazendo à luz verdadeira,

Como única premissa,

Esse brado comovente;

É o sangue dos inocentes

Pedindo à história justiça!