UM SONHO E NADA MAIS

Carlos Omar Villela Gomes

 

 

Espalhou na madrugada seu olhar,

como campeando os motivos

dos tantos rastros deixados,

dos retratos apagados

de quem foi, pra não voltar...

Renasceu na luz de um fogo antigo,

pela estranha benção, ou castigo

de querer, sem alcançar...

De lutar pela paixão de um sonho

e nada mais...

 

O cavalo, os arreios, as lonjuras,

noite escura, erva buena, imensidão...

Alma de estrelas abraçando o tempo,

tantas esperas retoçando o peito

que já faz tempo, ganhou a liberdade

enfrentando as solidões e tempestades

pela paixão de um sonho

e nada mais.

 

Campeiro sim, correndo as sesmarias

de pago em pago, recortando os mapas...

qual uma nova incursão farrapa

buscando um naco de dignidade

pelas distâncias do seu próprio chão,

que ainda existem homens de verdade...

que ainda existe fé no coração.

 

Um ranchinho, já faz anos,

mal se lembra;

A paz, uma flor, uma razão,

e a clara lua do olhar da prenda...

 

Depois a estrada, a poeira, o infinito

que tomou por seu sem pensar,

atrás de algo que julgou perdido

em algum avesso incerto

das trilhas gastas que compõe o mundo,

ou além de cada novo passo

que estradeia firme, sem jamais voltar.

 

Espalhou na madrugada seu olhar

com a mesma febre do furor gaudério

que gravou seu nome na figueira antiga,

guardiã dos tempos que vagueiam sós.

Matizou um viver tão diferente,

sem injustiças e desigualdades,

ceifando a fúria das razões covardes

que roubam pão e oferecem pó.

Há tantos retirantes neste tampo,

descrentes de paz e divindade...

Alguns deixando as cruzes da cidade,

alguns deixando a fome desses campos,

entregues às agruras do destino

que por maula, lhes negou a sorte.

 

Mas ele não se entrega, ainda insiste,

talvez não mais com o braço firme e forte,

mas com a mesma coragem e tutano

de escrever a sua própria história...

Somando mais derrotas que vitórias,

mas por certo a história de um valente.

 

Horizontes...

Ah, horizontes são pequenos pra quem nunca para,

querendo mais do que a visão alcança...

Alimentando a sublime esperança

de encontrar o ouro puro das searas

que esperam ricas num confim do mundo,

dando fortuna aos que souberam crer.

 

Filhos não teve, ao menos que soubesse...

Deixou raízes já quase desvalidas,

nesta coragem de pechar a vida

que às vezes fecha as portas pra o cristão,

e faz brotar no mais dócil coração

indagações, revoltas, temporais...

 

Firma o olhar na madrugada fria

numa feição misto futuro e nostalgia,

calando as dores que machucam fundo,

buscando um amanhã bem mais fecundo

co’a paz de quem se foi na ventania

pela paixão de um sonho,

e nada mais!!!