A CULPA É TUA

Carlos Omar Villela Gomes

Intérprete: Tânia Goulart

Amadrinhador: Piero Ereno

Poema participante da 12ª Sesmaria da Poesia Gaúcha

Vencedor do prêmio de 2º Lugar Melhor Poema

 

 

Se não estás aqui não tenho culpa,

Mas se eu estou aqui, a culpa é tua!

Não soube dos teus trancos e teus sonhos,

Nem lembro dos teus passos pelas ruas.

 

Não respirei teus medos e silêncios,

Nem tive o teu rosto em minhas mãos...

Não sei a dimensão dos teus momentos

Mas trago, a me levar, teu coração!

 

O nó da minha garganta desatou-se

Logo depois que tua voz calou-se...

Eu não sei onde nem por que razão.

 

Se não estás aqui, não tenho culpa,

Mas se eu estou aqui, a culpa é tua!

Se hoje sigo meus trancos e meus sonhos,

Se ainda gasto passos pelas ruas.

 

Te foste, mas ficaste, simplesmente,

Na minha vida, entregando mais que o bem;

Navegando no olhar de um outro alguém,

Que há pouco só mirava escuridão...

Te indago com espanto e com respeito:

Bem mais que o sangue pulsando no meu peito,

Qual o tamanho do teu coração?

 

Em algum canto, um pai, sem ar, em uma cama...

Em outro, as sombras de uma mãe em dissabor;

Os filhos pela volta, cabisbaixos,

Impotentes, mesmo tendo tanto amor.

Logo adiante, um piá contava as horas

Vendo seu sangue circular por um motor!

 

Daí a pouco, o terror de uma tragédia,

Uma vida que acabara sem querer;

A pior dor pesando a cruz de uma família,

Em seu calvário, carregado de sofrer...

Bendita luz de Deus, que nunca cega!

Pois a dor, em doação, se fez entrega

E dessa morte outros puderam renascer!

 

É o milagre da vida que veio através de ti,

Pelos frutos dessa entrega que semeaste por aí...

No pai que passa, risonho, trazendo o filho no colo,

Na mãe que enxerga suas crias brincando frente aos meus olhos...

No piá que corre faceiro, tenteando algum bem-te-vi!

 

O coração é um órgão

De carne e pulsação...

Que se transforma em poesia

No ato da doação.

Pois quando se doa um órgão

Se tem a exata medida

Que o amor que plantamos

É bem maior que esta vida.

 

Se não estás aqui não tenho culpa,

Mas se eu estou aqui, a culpa é tua!

Também por outros, com seus trancos e seus sonhos,

Também por outros, com seus passos pelas ruas.

 

Bendita seja a família que respeitou tua vontade...

Bendita história de alguém que soube amar de verdade

E entregou esse amor em forma de doação!

Te indago com espanto e com respeito:

Bem mais que o sangue pulsando no meu peito,

Qual o tamanho do teu coração?