GAÚCHA
PRAIANA
Aureliano
de Figueiredo Pinto
Da
cidade do Rio Grande,
adolescente
se viera
às
solidões missioneiras,
onde
ficou a morar,
com
pobrezas e trabalhos,
nunca
mais poder voltar.
E,
sempre olhando as coxilhas,
dizia
aos netos e filhas:
- Quando
olho para as coxilhas,
tenho
saudades do mar...
E,
já com quase noventa,
na
solidão missioneira
contava
do mar em festa:
- A
praia de povo, assim!
Barões
de fraque... Alamares...
e o
mar, um campo sem fim,
brilhando
num resplendor!
Bandeiras...
hinos... fanfarras...
Porque
vinha entrando a barra
a
Escuna do Imperador!
Torpedeiras
e corvetas,
couraçado
e cruzador.
Popas...
proas... e escotilhas
quando
ela se punha a explicar.
Dando
o vento nas flechilhas
as
onduladas coxilhas
são
como as ondas do mar...
Quando
a grande lua cheia
no
escurecer vinha vindo,
era
um navio do mar alto,
bordejando,
a aproximar.
‘Stava o Prático pedindo
para
na barra aportar.
- A
pobre! Por tanto tempo
no
exílio de terra dentro,
com
a nostalgia do mar.
Quando
as carretas toldadas,
cortando
as largas campanhas,
vinham
a descarregar,
ela
dizia: - No cais
é
assim que os navios encostam,
com
cantigas nas descargas
das
cousas que vem do mar.
Viu
generais e almirantes!
Gentes
de todas as terras,
no
velho porto baixar.
E
as gurizadas gostavam
desses
contos que bisavam:
-
Vozinha... conta do mar.
O
mar, então, era o mundo,
novo
e estranho, que atraia
e
fascinava os gauchinhos,
fazendo
a velha falar.
E
eram animais medonhos
que
os assustavam nos sonhos,
sonhando
as lendas do mar.
Tinha
cavalos-marinhos
que
não se podem encilhar.
Touros
com aspas de prata
que
não se podem laçar.
E
há uns vaga-lumes nas águas
que
não se podem pegar.
Sereias
de voz macia
para
os marujos tentar.
Praias
de areia alvadia
para
as crianças brincar.
Suas
pupilas aflitas
eram
duas estrelitas
boiando
na água do mar.
Quando,
em manhã luminosa,
ela
deixou de falar,
aos
gestos pediu janela
para
a campanha ainda olhar.
Depois
inclinou a fronte
e
parou de respirar,
em frente
ao grande horizonte
com
céu no campo a encostar.
E
lá se foi - pobrezita!
Naufrágio
de um sonho lindo.
Barquita
se despedindo
com
uma saudade a acenar.
Ou
como uma ave que emigra,
retardatária
seguindo,
para
sempre sumindo
sobre
as lonjuras do mar...