MIRAGEM NA CURVA DO OLHAR

ARI PINHEIRO


Hoje eu acordei poeta...
E a estrada real me parece
Muito menos com a partida.
Aliás, a velha trilha dos retirantes
Está vestida de poeira nova
E sol vespertino
Desenha figuras no horizonte...

Figuras de mil tauras que voltam
Pra beber na paisagem
A seiva ancestral
Que dormita tranqüila
Na paz destes campos!

Perfilados nos arames
Formam alas os pelinchos,
Numa continência muda
A tantos bravos que passam!

Lá vêm eles...
Estão mais perto agora...
E os capacetes de obra
Começam virar chapelões de abas largas
Que adornam com graça
Os semblantes sofridos...

De repente,
Os aventais de oficina
Viram ponchos alados
Na manhã destes pagos,
E ondulando pacholas
Acenam faceiros
À inquietos cardeais
Que espionam das moitas!

Ah! E os fletes...
Até antes da curva
Apenas calhambeques de frete
Mas agora... Que flor de fletes!
De crinas ao vento, parecem centauros
Encurtando distâncias
Pra o lado de cá!

E além...
Despontando na retaguarda,
Seriam carretas?
Sim! São carretas!
São as velhas carretas lerdas,
Lerdas e cantadeiras
Recheadas de provisões...!

Eis o meu povo de volta
Chegando de manso na curva do olhar!
Não mais parecem farrapos
São tauras garbosos tomando de volta
O que sempre foi seu!
Galopam seus potros pelas pradarias
Buscando nos sonhos
Razões pra ficar...
E as sangas faceiras
Abraçam com graça
Os corpos suados
Que vem descansar!

Pra quem volta aos pagos
Pouco importa caminhos ou atalhos...
A alma sempre chega pilchada
E de à cavalo!

Que bom que hoje acordei poeta!
Amanhã... Amanhã, de repente,
Nem mais acorde assim...
Mas hoje... Hoje eu estou poeta!
E posso receber de alma aberta
Mil tauras que voltam
Pra beber na paisagem
A seiva ancestral que dormita tranqüila
na paz destes campos!