Rondó por Dona Constança
Apparício
Silva Rillo
Porque toda a gente
chora
quando devia sorrir?
Só Dona Constança sabe
que era hora de dormir.
Neste rondó mui antigo
vós quero, dona Constança
em vosso sono embalar.
Em vosso sono pesado
que não tem mais madrugar.
Deste sono, avó Constança
que nem chorinho de neto
faz a que dorme acordar.
Vossas mãos, dona Constança,
de seda velha e arminho,
em vosso peito magrinho
postas em cruz estão quietas.
Vossas mãos, dona Constança,
que teceram bicharás,
que sovaram muito trigo,
que fizeram muito doce,
muita morcilha de porco,
muita rosca e muito pão,
que plantaram pé de rosa,
arruda e manjericão.
Vossas mãos, dona Constança,
fazendo muito bordado,
muito crochê, muita renda,
muito vestido de noiva,
muito cueiro pra neto,
muita mortalha, também.
Vossas mãos
que enxugaram pranto de filhos e netos.
Vossas mãos, dona Constança,
que sabiam castigar.
Vossas mãos arrependidas,
samaritanas e mansas,
mimando as mesmas crianças
que haviam feito chorar.
Porque tão brancas agora
as mãos tostadas da lida,
dona Constança – por que?
Por que agora não desfiam
as negras contas do terço
nas mudas ave-marias
pelos descrentes da estância
que não sabiam rezar?
E agora, dona Constança,
quem na estância rezará,
se vossas mãos se deixaram
no fio de prata do terço
brancas e magras se atar?
As mãos de dona Constança
no negro terço que as ata
tem a mesma cor de prata
da cruz de prata do terço.