DESPETALADA
Apparício Silva Rillo
- Tem quarto, dona Isolina?
- A Rosa! Mas quem diria!
- É pra ver, dona Isolina...
- Então, voltou a ser china?
E seu
amigo, brigaram?
- Brigamos. Me pôs pra rua,
cortou-me a carne e as asas.
E a mim, agora, o que resta
senão voltar para as "casas"?
Tinha quarto para Rosa
no cabaré da Isolina.
Cama, bidê e bacia,
mais a lâmpada azulada
- uma flor despetalada
na ponta magra de um fio.
Rosa pendura nos pregos
seus restos de imaginação,
salvados de seu naufrágio
de corpo e de coração:
suas rendas e seus risos,
anéis, berloques de guiso,
lembranças de deserança
queimando como tições.
Vinte anos de cansaços
se estiram sobre o lençol
onde manchas pardacentas
são como escarros de sol.
"Nunca
digas, dessa água
não beberei". Vem o dia
- e Rosa o vive morrendo -
em que um esgoto escorrendo
sabe a puros de cacimba.