BOI BARROSO
Apparício Silva Rillo
Meu boi barroso, lendário,
haragano e teatino,
te criaste sem destino
vagando pelo rincão;
usando mil artimanhas
cruzaste nossas campanhas
sem ninguém botar-te a mão!
Jamais a armada de um laço
conseguiu cingir-te as guampas,
nem existiu nestes pampas
onde ecoava o teu berro,
gaúcho de tanta manha
que te queimasse a picanha
com a marca rubra de um ferro.
Tu zombaste, enquanto vivo,
de quando quebra gabola
que te saísse na cola
pra te quebrar o entono.
Segundo eu sei de memória
jamais ninguém teve a glória
de intitular-se teu dono!
Certo dia um
tal Blau Nunes
- Índio velho mui vaqueano -
te seguiu por mais de ano
cruzando campo e perau.
Blau Nunes, nessa cruzada,
com a salamanca encantada
topou-se, lá no Jarau.
Pois o Blau, que era o mais taura
gaúcho destas campanhas,
enredou-se em tuas manhas,
no teu rastro se perdeu.
Não pôde trazer-te o couro,
só trouxe um dobrão de ouro
que a Mãe do Cerro lhe deu.
Meu boi barroso haragano!
És o símbolo da raça
que curtida na fumaça
de muitas revoluções,
jamais em sua existência
permitiu que a prepotência
vicejasse em seus rincões.
Na altanaria do guasca
adivinho a tua imagem,
teu desentono selvagem
neste povo sem maneias
que há centenares de anos
reveza o frio dos minuanos
pelo calos das peleias!
Teu gênio altivo retrata
o índio venta-rasgada,
que não tem guampa furada
nem se achica pra ninguém;
que briga, sem ser maleva,
pra honrar o nome que leva
e os fios de barba que tem!
Sempre que a lua embarriga
teu fantasma a gente avista,
passando o pago em revista,
fiscalizando o rincão;
porque tu és, na verdade,
o gênio da liberdade
resguardando a tradição!