MARIA SERAFINA
Rosana Araujo e
Anderson Fonseca
O conto de fadas
de Maria Serafina aconteceu...
O lugarejo que,
no século XVI,
Fora campo
aberto de planícies e ventos...
...ganhou traços
açorianos numa aquarela vilarenga
E tijolos
argamassados de esperanças
Foram o alicerce de paredes e sonhos.
A lagoa Armênia
ganhou vizinhos
Pra os mates manhaneiros...
...e Taquari se
fez casa para negros, italianos e
Para as
germânicas famílias de além mar.
Ruas socadas a
cascos de boi
Riscavam a
geografia disforme da vila
Deixando de um
lado, a casa que era um castelo,
A plantação
rasteira,
Que ocupava as
mulheres nas tardes de sol...
...e do outro,
as frondosas que tapavam os pôr-de-sóis
E limitavam, em
visão e em escassas soalheiras
Onde, como
glutões, se comia dúzias de laranjas.
O caminho da
escola era encantado...
As calçadas
limpas de vassouras campeiras.
A praça com
poucos bancos...
A rusticidade da
escadaria da igreja
Artesanalmente
plantada ao pé de sua cruz.
Árvores floridas
que pareciam imensas
Para um par de
olhos de 6 anos.
Havia um rei
neste conto...
Temente ao Deus
de todos e fiel às suas leis.
Era um desses
homens que o campo
Trás de suas
entranhas, para o mundo...
E o faz perene
no moroso passar do tempo.
O pai, de traços
ameríndios e voz forte,
Trovoava
militares ordens e regras...
...que uma
doçura de criança
Teimava em
desobedecer.
A aparente
aspereza, ora,
Transmutava-se em doçura...
...e a cadeira
de balanço valseava
Em seu colo,
junto de seu capote,
O sono indefeso
da filha adormecida.
A imensa mesa
lusitana na varanda
(que se dividiam
no pão e na prece)
Era tomada por
coloniais guloseimas
Nas pausas
mansas da tarde.
O pequeno quarto
de janelões grandes
Contraponteavam
as pequenas eiras e beiras
Do exterior
pálido e ocre do seu palácio.
Seu castelo de
sonhos não era rico...
... Não de ouros
e tesouros.
Mas em carinho e
cuidado com os “seus”...
... Em dichotes
e risos soltos...
... Em comunhão
e unidade em família...
... Na crença e
na fé repartida no pão.
Os
bisavós portugueses em
constante vigília
Na moldura
envelhecida da sala de estar...
Pálidos de cores
e de sorrisos,
A seu modo, são o passado do presente
Deste mundo encantado.
Um mundo do faz
de conta e realidade
Que não sofreu
as mazelas do tempo.
Havia também um
cofre... Secreto.
Para muitos, uma
simples mesinha ao lado da cama.
Mas para Maria,
um esconderijo
De incontáveis
riquezas a sete chaves guardadas...
...e no fundo da
gaveta, uma esmeralda,
Esverdeada de
pedra e de tempo.
A esmeralda já
não existe... Se é que um dia existiu.
Mas aquela
ínfima mesinha...
...ah, aquele
cofre segue a guardar tesouros,
Só que agora, de
lembranças de uma vida de sonhos.
Maria Serafina
coloria seu pequeno mundo em aquarela...
Passível de
pincéis e tintas pincelava histórias!
Encontrou em uma
toalha sem vida,
A razão do seu
viver!
Brotou de suas
mãos o labor diário.
Paixão e
trabalho!
Hoje, vó
Serafina, mãos trêmulas, abraçada em uma toalha...
Meus olhos vão
de encontro aos seus...
Em sua cadeira
de balanço - a mesma que
Embalou-se ao
colo do pai-
Sorri, e me
conta com brilho no olhar
Todo o encanto
de uma infância mágica.
No canto do
quarto, a mesinha sem esmeralda
E o pote de
pincéis empoeirados.
São estas as
memórias nítidas de um conto mágico
que a infância lhe presenteou.
O conto de fadas
de Maria Serafina aconteceu...