CORREDOR

Douglas Dhiel Dias

 

Há um silêncio pairando

nas chircas da tua margem,

que empobrecem a paisagem

denunciando o abandono...

Feito um ranchito sem dono

– onde o nada é senhor –

teu caminho rastreador

vai sumindo lentamente;

e dói na alma da gente,

teu destino… corredor…

 

Tudo em ti é saudade...

Nada em ti é movimento...

Mas quem te viu n’outro tempo

compreende tua soledade;

pois teu trecho, em verdade,

tinha valor na querência!

… Hoje restaram ausências

pelos rastros apagados,

e parece até que o pago

esqueceu tua existência...

 

Não cruza mais, o tropeiro,

no teu velho itinerário...

Tinha em ti um ementário

onde lia o fundamento

pra andar mesmo que o vento

sem rumo, nem paradeiro!

Teus atalhos… atoleiros…

tudo sabia de cor…

Era o amigo melhor

do coração estradeiro!

 

Caminito das tropeadas

que tantas e tantas vezes

cruzaram miles de reses

seguindo para as charqueadas…

Apagaram-se as pegadas...

silenciaram os cincerros...

e o aboio dos ponteiros

não ecoa nestas plagas;

que o gado vai na carga

dos caminhões boiadeiros...

 

Já não abrem as porteiras

nas partidas e chegadas,

rangendo enferrujadas

pelo tempo que as condena.

Repartem a mesma cena

na tela do teu retrato:

sucumbidas pelo mato,

cadeadas e sem função;

porque os portais do rincão

foram pro lado do asfalto.

 

E até mesmo a primavera

parece que não quer mais

pintar a cor dos rosais

sobre o gris do teu caminho.

Ficaram os espinhos

(defensores nas macegas)

mas que trazem pontas cegas

pois não afiam a pua

no couro da pele nua

se o cruzador te renega.

 

Somente a D’alva – madrinha –

não te abandona por nada!

Volta toda madrugada

pra luzir no firmamento…

Parece, por um momento,

que nessa estrela tão bela,

uma chama singela

tal se a alma dum andejo

na intenção de um cortejo

te acendesse uma vela…

 

Me dói olhar teu destino...

teu exílio… teu desterro...

Pois foi o rumo primeiro

dos meus passos de guri…

Se outrora marquei em ti

algo que o tempo apagou,

tu – indelével – deixou,

com teus segredos e manhas,

uma influência tamanha

no homem que hoje sou!

 

Eu choro junto contigo

pelo fio dos alambrados,

o teu pranto enserenado

se tropeço nas lembranças...

Foi o palco das andanças

desses meus sonhos tão nobres

que fizeram um peão pobre

trabalhar sobre teu chão

e mudar de condição

depois de juntar uns cobres.

 

E à sombra da história

teu caminho se perdeu...

Mas deixo um último adeus

para saudar tua memória,

teus rumos, trajetórias,

teu caminho rastreador...

Eu reparto a mesma dor

do rincão te esquecendo;

de ver o pago crescendo

longe de ti... corredor...