ONDE DORMEM AS SOLIDÕES

Adão Quevedo

 

Mais de um século de almas

habitam a casa antiga,

onde o vento faz cantiga

de ninar para os fantasmas...

...E as solidões dormem calmas.

Passado, agora é presente:

(Água boa, de vertente,

e que aroma de tempero!!!

Da cozinha, vem o cheiro,

da panela em ferro quente )

 

...abrigo antigo de avós

povoando filhos e netos,

se eram escassos os afetos,

respeito, havia entre nós,

ninguém levantava a voz

desrespeitando os mais velhos...

e a rigidez dos conselhos,

forjas a os ideais.

O olhar firme dos pais...

Atravessava os espelhos.

 

Paredes pela metade,

o forro vazando estrelas,

por onde a lua, sinuela,

pinta de prata a saudade

sem saber que a mocidade

fica presa nos retratos...

Nosso inimigo, de fato,

 ...bem disfarçado... É o tempo...

rouba o que foi sentimento,

devolve silêncio e mato.

 

O poço, em sua moldura,

arredondada de pedra...

Espelho que ás vezes quebra,

recompõe caricaturas,

guarda, nas suas funduras,

os segredos do passado...

Revela, por outro lado,

a austeridade tio tempo

nos repontando bem lento,

feito uma tropa de gado.

 

A saudade... Apunhala...

Nos momentos de inquietude

emoldura a juventude

que trago junto, na mala...

Alguns remendos no pala.

as botas, solados gastos...

Vou carregando, de arrasto,

o meu destino de andejo,

igual a mim, eu te vejo...

-Velha casa... aos pedaços.

 

Há imagens em esboço

na memória adormecida...

O espelho, velho, da vida,

Vai trincando o rosto moço:

igual o balde do poço

mergulhado, bem no fundo...

Restam os sonhos, oriundos,

de sentimentos, mais ternos,

que nos tornaram eternos...

- Nos relicários do mundo

 

Casa antiga, eu jamais,

vou te habitar tanto assim..

Sou de ti, tu és de mim,

nossas almas são iguais...

O vento, pelos beirais,

toca a mesma cançao...

És fonte de inspiração,

morando dentro da gente...

...e a saudade é ferro quente

marcando o coração!