O TEMPO DA SAUDADE

Jurema Chaves

Saudade é algo que fica

Nas marcas que o tempo deixa

De sonhos, risos e queixas

Para nunca ser esquecido

Algum momento vivido,

Na memória da emoção

E como um laço trançado

Com tentos do coração!

Que o tempo trança tenteando

Deixando calos nas mãos.

 

Nas dobras da madrugada

E que a saudade se recria

Pinta, borda e tripudia,

Num coração machucado,

Docemente aprisionado,

Num estranho bem querer.

Tudo que tento escrever

Tudo o que eu quero juntar

Vive o tempo a separar

Levando o que eu quero ter.

 

A saudade não tem mais jeito

Do jeitinho que ela tem

Abre a cancela do peito

E traz de volta quem não vem

Cria silhuetas nas sombras

Empurra a porta e arromba,

Sem perguntar pra ninguém.

 

Saudade é coisa esquisita

Só faz um taura sofrer

Não deixa a gente esquecer

Um perfume sobre o catre,

Amarga o gosto do mate

Sulcando marcas no rosto

Timbrado pelos agostos

A melena encanecida

Buscando réstias de vida

Com olhar de sol já posto!

 

Saudade é minha parceira

Pra onde vou, de onde eu venho,

Saudade é tudo que tenho,

Dorme comigo e me abraça

Bebe o vinho e quebra a taça,

Nunca me deixa sozinho

E como a flor com espinho

Que nos machuca e perfuma,

Com seus fantasmas e brumas

Cicatrizando os caminhos!

 

A vida, o tempo, a saudade

Esse trio onipresente

E chora o taura contente,

Rascunhando a sua dor

Se faz poeta, cantor

Abraçado na guitarra

Solta a alma de cigarra,

Em verões plenos de amor.

 

Assim desabafa o pranto

Sobre a branca celulose

Que estranha simbiose

De quem canta soluçando,

Vê a esperança mermando

E o tempo louco a girar

Vai desbotando o olhar

Voando em asas de vento,

Pra não ver passar o tempo

Vivemos sempre a passar.

 

É nessa hora que a saudade

Com afiadas esporas

Rasga a alma, nos devora,

Com fúrias de temporais

O tempo geme seus ais

Sem nunca, nunca parar,

Parando, sem se notar.

Nós, que por ele passamos

Pelos caminhos que cruzamos

Jamais nos deixa voltar!

 

É tão fugaz esse tempo

E tão perene a saudade!

Parece uma eternidade

Quando se vive a esperar

O tempo doce de amar,

Que foge por entre os dedos,

Rasurando seus segredos

Que nunca conta a ninguém.

Assim nesse vai e vem

Ficamos fingindo esperas

Sabendo que a primavera,

Parte no próximo trem.

 

A saudade não se inventa,

E não imita ninguém

Esse jeito que ela tem,

De pisar tão dolorido,

Num pobre sonho caído

Que teima em se levantar

Que insiste ainda alcançar

0 que um dia foi sorriso...

E hoje um verso partido,

Que o tempo não quer juntar!

 

Quisera prender o tempo,

Palanquear o destino

Entender o desatino

Que fica dentro da gente,

Com aroma permanente

Num amargo adocicado

Com gostinho de pecado

Alongando as madrugadas...

Nas lembranças remendadas

De um soneto inacabado...