DESCULPAS DE UM PEÃO
Djalma Corrêa Pacheco
Te peço desculpas,
Por quase uma vida
inteira
De pouco afeto ofertado.
Pelo mutismo exacerbado
Por pouco verbo
pronunciado
Por não ter te falado de
amor.
Na rudeza da mangueira,
Quanto gado eu marquei?
Quanta
bicheira curei?
Estirei quanto alambrado?
Mas não parei um só
momento
Pra te falar de
sentimentos...
Ficaste sempre de lado.
Quantas vezes,
Sem te fazer um carinho
Sem te lançar um olhar,
Saía cedo pra lida
E voltava da recorrida
Já bem depois do poente
Sem te trazer de presente
Sequer uma margarida.
Quando ao rancho chegava
Da mesma forma, calado,
Tu vinhas, sempre incontida,
Com o chimarrão já cevado
E puxando qualquer
assunto,
Somente para estar junto
Te sentavas ao meu lado.
Eu sempre acabrunhado
Mal respondia aos sorrisos
Que, generosa, me
ofertavas.
Muitas vezes, nem escutava
Aquilo que me dizias
No meu mundo, ensimesmado.
Quantas vezes, minha
linda,
Quando a lida permitia
Algum momento de ócio,
Eu me parava a pensar
Me comparando com os potros:
Por que eu era tão
aporreado
E mesmo com tanto cuidado
Não me deixava domar?
Por que mesmo com
brandura,
Com benquerença e
atenção,
Eu me mantinha tão
aporreado?
Por que eu era tão
gavião?
Em algumas noites
silentes
Eu abraçava o violão
E coplas saíam do peito.
Com a voz desafinada,
Te
falava, minha amada,
Com três ou quatro acordes
E palavras que eram de
outros
- Mesmo sem perceber –
Tudo o que queria te dizer,
Mas não encontrava
maneira.
De quando em vez, morena,
Nalguma changa graúda
Ficava dias
distante...
Quando a lua se achegava
E a peonada se atirava
Pr'alguma farra noturna
De china e de cachaçada,
No meu catre, eu ficava
- Pois, graças a Deus, adorada,
Canalha, eu nunca fui –
E ali, na solidão,
No silêncio do galpão
Eu lembrava de teu rosto
Rememorava teu sorriso,
Recordava teu cheiro,
Sentia falta de teu gosto...
E por mais distante que fosse
Como que levado pelo vento
Em segundos eu estava
Ao teu lado, em pensamento.
Sim, eu sabia o que era amor!
Sim, eu sabia que te amava!
Só não sabia expressar.
Agora, de nada adiantam as palavras
Aliás... nem mesmo as posso dizer.
Faço agora meu caminho derradeiro...
Por seis argolas, sustentado
Por seis amigos, levado
Serei na terra plantado
Em sepultura de campo
Sem conseguir te dizer
Que sempre foste meu apego
Sempre foste meu bem-querer.
Aos poucos, me fundirei com a terra
E brotarei em flechilhas...
E se um dia, maçanilhas,
Jasmins, lírios, margaridas,
Caliandras, amores-perfeitos
E outras cores e perfumes da pampa
Nascerem na minha campa
Sou eu, te entregando, querida,
As flores que quando em vida
Eu nunca soube te dar.