Poema do Entardecer

Adão Quevedo

 

Cai a tarde, de mansinho

E o pago inteiro se aquieta,

Foi Deus, pintor e poeta,

Quem fez a tarde, aos pouquinhos.

Primeiro, pensou com calma,

Fez a pampa, as coxilhas,

O gado, a sanga, as tropilhas

E a querência ganhou alma.

 

Depois, mateando solito

Frente ao rancho celestial,

Deus foi declinando o sol,

Na imensidão do infinito.

Mirando o açude, imenso

E a flor azul do aguapé,

Deus, inspirado, em sua

Criou a paz e o silêncio.

 

Logo, deu dom, ao Forneiro

De erguer seu rancho barreado...

Sem tramela, bem postado,

N’algum moirão, do potreiro.

Deu um par de asas com lanças,

A um campeiro, sentinela...

O quero-quero, tagarela...

Guardião do campo e da estância.

 

Deu leveza a garça parda,

Com a tinta, meio borrada...

Fez a perdiz, disfarçada,

De terra, campo e macega.

Sobre um cepo de madeira,

Deus ia se emocionando,

Escrevendo e recitando...

-Sua poesia campeira-

            

Até o cusco, que dormia,

Sobre um pelego encardido,

Desperta e presta sentido,

Na rapa, do fim do dia.

Quando olhou o horizonte,

Pediu às mais belas flores

Que emprestassem suas cores

E então, pintou o poente.

 

O sol, acalmando as brasas,

Sabe que a lua escondida...

-Sua noiva prometida-

Virá rondar sua casa.

O Rio Grande nos afaga,

O campo abraça sua gente...

Desperta sonhos, dormentes

Quando o arrebol se propaga.

 

Romance de luz e sombras

Num rodeio de aquarelas,

A emoção abre as cancelas,

Enquanto Deus finda a obra.

E assim, o entardecer,

Por tamanho encantamento,

No pago fez-se o momento

Para alma anoitecer...