BRIGA DE TOUROS

Zeno Cardoso Nunes

 


A chuva de verão passou.

Veio a estiada.

O sol, a pino. A terra, inda molhada.

 

Um zebu, está esperando no rodeio

outro touro, um crioulo guapo e feio

que sempre fora o dono da invernada,

e o passo largo vem se aproximando,

e vem cavando terra, e vem berrando

tão grosso que parece trovoada!

 

Encontram-se e pelejam com denodo,

pondo em agitação o gado todo.

As aspas do zebu, velozes como raio,

riscam do contendor o pêlo baio

que ao sol reluz e brilha,

enquanto os cascos de ambos,

como arados,

sulcam os pêlos verdes e molhados

do lombo da coxilha!

No ardor da luta entesam os pescoços,

enrijecendo os músculos potentes

em férrea contração!

Depois vão se golpeando duramente,

com orgulho de touro não vencido,

com destreza de tigre enfurecido,

com raiva e decisão!

 

Uma hora eles passam nessa luta

de esforços colossais,

mas, envoltos na fúria do mormaço,

sentem fraquejar os músculos de aço,

lutar nem podem mais.

 

Há pairando no ar morno e pesado

um forte cheiro de chifre queimado.

 

Os dois touros, briosos e valentes,

são iguais na coragem, no valor.

Mas no entrechoque bárbaro das guampas

o destemido filho aqui dos pampas

começa a demonstrar que é superior.

 

 

O zebu bem conhece a luta bruta

lá da Índia selvagem de onde veio,

mas não pode vencer, por mais que o queira,

o touro aqui da terra brasileira

que o obriga a deixar o seu rodeio.

 

E triste, machucado e abatido,

depois de luta tão desesperada,

o pobre touro, além de ser vencido,

inda foi pelo outro perseguido

até sair de dentro da invernada.

 

Dias depois os corvos carniceiros,

voejando por cima de um banhado,

indicavam aos olhos dos campeiros

o lugar onde estava,

entre espinheiros,

a carniça do touro derrotado.

 

O seu corpo, que o sol acariciava,

parece que tranqüilo descansava

do combate fatal,

enquanto em torno o gado, compungido,

cheirando o chão, de um jeito comovido,

berrava tristemente um funeral.

 

Dentre aquela sentida orquestração

destacou-se um mugido forte e grosso

que reboou plangente no rincão:

 

Era o berro do touro brasileiro

lamentando o destino do estrangeiro

que quisera ser dono do seu chão.