O PIANISTA

Vaine Darde

 

Era para ser apenas um concerto.

Um pianista e a platéia.

Mas, Como se fora um deus da música

impôs sua presença com acordes celestiais...

Houve uma troca de olhares entre nós...

Nossos olhos conspiraram promessas,

juras, possibilidades de infinito.

 

E o que os olhos conspiraram,

qual presságio indefensável,

 sortilégio do amor...

Foi loucura desmedida,
desatino do destino,
desatado desvario:
Um idílio em seu exílio
começando pelo fim...

 

O amor, em seu trajeto,

é um acorde impetuoso

que encanta enquanto vibra.

É o grito de cristal de uma taça que se quebra...

 Harmonia dos sentidos

que se tangem no silencio.

O amor é sinfonia que se faz sem partitura;

é, em nós, o que se mata

pra nascer no ser amado!

 

Foi então que percebi o encanto em mim agindo...

O exercício da paixão na razão subjugada
e a música me impondo seu domínio inebriante.

(- Ah, coração de poesia, tu és frágil ao que ouves,

és volúvel ao que vês!)

Mas, que alma tem defesa ao desígnio do amor,
se a música e o amor são amantes passageiros?

 

Eu nem sei se foi amor ou loucura musical,

se um caso no ocaso, ou aurora sem manhã,

ou o som que encanta os olhos na memória dos ouvidos?

Quando amor se torna música

a razão suspira em dó

e há uma fuga das virtudes

numa pausa do pudor.

 

Pois, um homem ao piano
detém todos os poderes
quando os olhos que o fitam
só enxergam poesia...

E o que pode uma mulher

quando um deus em seu fascínio

a invade, pela alma,

com “Beethoven” no olhar?

 

Quantas vezes, na penumbra,

tive ciúmes do piano, Esse mágico objeto,

relicário do ofício?

Hoje penso, em minha insônia...
Que nas mãos do pianista
não fui mais que um instrumento,
exercício de um prelúdio,
um noturno a mais em si.

 

Suas mãos me acariciavam
e eu podia ouvir a música
que fluía de seus dedos,
qual se um frenesi de acordes
percorresse-me a pele,

qual se a Nona Sinfonia

me invadisse pelos poros...
E, assim, em suas mãos,
de caricia em caricia,

pouco a pouco eu me tornava

sua trilha musical...

 

Hoje em mim há um silêncio

de acordes sensuais,

e uma sala de concertos
solitária ao descaso;
A estranha vibração
dessas notas que perduram
quando finda o recital...

 

O pianista foi em busca

de outros sonhos, outros palcos,

mas, deixou música em mim,

deixou glissandos em mim,
deixou suas digitais

trêmula e sonoras

tatuadas para sempre

no que vive na saudade.

 

Bravo !