QUANDO AS LEMBRANÇAS VEM PROSEAR NAS TARDES

Sebastião T. Corrêa

 

Quando me sento

Nos fins de tarde, de fronte ao rancho,

E sorvo ausências

No gosto amargo das cevaduras;

Me vem de longe,

Montando em pêlo, num pensamento,

Uma lembrança,

Velha e estropiada pelas lonjuras.

 

È o campo largo

Nas sesmarias da minha infância,

Onde extraviei

Todos meus sonhos de liberdade;

Quisera um dia,

Na ilusão de moço, campear venturas,

Por entre os brilhos

Tremeluzente da cidade.

 

E aos corredores

Juntei-me, então, a outros tantos,

Que também iam,

Pelos fascínios dos horizontes,

Onde pescavam,

Nos fins de tarde, brilhantes lumes,

Quais vaga-çumes,

Em contradanças, por sobre as fontes.

 

As luzes eram,

Nos horizontes, de onde piscavam,

Convites ternos

A corações que campeavam afagos;

E a cada passo

Que dei em busca de seus encantos,

Fui me afastando

Do amor fraterno que tem os pagos.

 

Enfim, o encontro,

E a majestade dos castiçais,

Clareando um mundo

De fantasias e arranha-cèus,

Onde os viventes

Por entre as grades dos edifícios,

Cumprem ofícios,

Emangueirados em mausoléus.

 

Enquanto isso,

Nos arredores desses povoeiros,

Outros luzeiros

A desnudarem os rancherios;

Pelas favelas,

Geme o minuano,

E pelas frinchas

De cada rancho, galopa o frio.

 

Nos rapadores,

Vazios escassos entre ruelas,

Em cavaletes

Erguem-se os chifres das rezes mortas;

E os “sem cavalos”

Lançam rodilhas, de dor e mágoas,

Cerrando armadas,

Que valem nada e em nada importa.

 

Há um ar de tédio,

Que se confunde com a nostalgia,

Desses que de dia

Já desistiram de ser rurais,

Como há no grito,

Que é de protesto, dos quero-queros,

Marcando espaços,

Entre os piquetes de alguns quintais.

 

Então me vejo,

De fronte ao rancho, sorvendo ausências,

E esta saudade,

Que é mais amarga que as cevaduras,

Do campo largo,

Sobrou-me apenas reminiscências,

Nem mesmo o rumo

Já não encontro, nessas procuras.

 

A tarde morre

Tão lentamente, como os meus sonhos,

Que um dia foram

Potros alçados, pras minhas ânsias;

E há no meu rosto

Por entre as rugas, dois sóis de brasas,

Sanguenoleando,

Nos olhos rubros de olhar distâncias.

 

Quem sabe um dia.

Junto as lembranças, que em mim sobraram,

Busco a coragem,

Que extraviei pela vida á fora;

E enquanto sorvo

O gosto amargo das cevaduras,

Saio a procura

Da liberdade, que tive outrora!!!