Pra quem tem Pátria na Alma

Sebastião Teixeira Corrêa

 

 

Escorropicho esse mate até o ultimo gole

Porém a sede do copo

Não é maior que a secura

Que trago dentro da alma

Esse viver emprestado entre muros e asfalto

Torna minha alma um deserto

Onde a torreira é tão forte

Que as sementes dos meus sonhos

Não conseguem germinar.

 

Um dia bandeei pra cá nos louros da mocidade

Com força de agarrar potros

E a coragem de quem pega touro ventena na cruzada

E mete os dedos nas ventas

Pra derrubar na mangueira

Com destreza pra um pealo

E com certeza de quem larga um doze braças comprido

Estirando toda corda pra cinchar de a cavalo.

 

Olhos de águia, e o peito, uma muralha pros golpes

Das intempéries teimosas

Que insistem em nos derrubar...

O que buscava? Até hoje

Ainda tento descobrir!

 

Talvez descanso das lides sofrido por tironaços

Talvez um pouco de espaço

Pois dizem que é de direito buscar posição social!

Ou quem sabe, a garantia de alguma changa decente

Pra amparar minha gente

Nesse mundo desigual...

 

Numa mala de garupa, juntei os poucos pertences

E o campo virou saudade

O olhar de longe pros pastos

A poeira encobrindo os rastros

Assim, rumei pra cidade...

 

Malvada ilusão aquela que às vezes nos faz pensar

Que a tal felicidade

É flor que habita castelos

Distantes pros nossos sonhos

Que a vida só tem sentido

Pra quem se torna povoeiro

E que o viver do campeiro não faz agente feliz.

Ninguém me disse o contrário

Nem um gesto nem palavras

Pra que eu tomasse tenência

Então deixei a querência, o rancho onde fui nascido

A coxilha onde crescido tironeava só por graça

Deixei o pingo estouro

Com fibras de pechar touro

Deixei amigos, parentes

Gente que gosta da gente.

Acho que não me dei conta

Que estava deixando eu mesmo...

 

Minha raiz campechana

Minha cultura encravada

Em cada palmo de campo

Minha memória que hoje campeia causos, paisagens

Que se extraviaram de mim.

Não vi o tempo passar

Há muito que ando correndo

Atrás de uma multidão que não sabe pra onde vai

Não sabem o que procuram

Mas mesmo assim continuam

Cada vez correndo mais.

Existem tantos potreiros nessa invernada do povo

Muitas mangueiras e bretes, muitos currais

De onde as tropas jamais conseguem sair...

 

Pra alguns o cerco é mais forte

E o trato mais racionado

Há que pastar-se ajoelhado

Garantindo o necessário

Quando amiúda o salário todo o brio perde a razão

E o cocho da humilhação

Emborca, vira ao contrário.

 

Quem vive de privilégios por certo se da melhor

Honestamente o trabalho

Não da riqueza a ninguém

Viver com dignidade

E tudo que um ser humano precisa pra ser feliz!

 

Pra onde anda a justiça

Prometida nos discursos que falam os candidatos?

O poder fere a consciência

Sobe a idéia a prepotência na gana dos insensatos.

 

Por onde anda a vergonha e a garra dos marca-touro

Capaz de dar um estouro pra espantar os graxains

Que na calada da noite

Vivem pilhando misérias sugando o sangue dos fracos

Fazendo rombos, buracos com instintos de cupins...

 

Peço perdão da revolta que ás vezes fala mais alto

Nessas horas em que o mate

Me traz o verde do campo

Na palma da mão

E escuto o meu coração me pedindo pra voltar

Me perdoem as palavras

Que as vezes soam pesadas

Mas tenho as vistas cansadas de tanta dor enxergar.

 

Queria voltar no tempo, encilhar um pingo bueno

Recorrer todas as estâncias

E contar pra todo mundo

Que esse luxo da cidade

É tudo, tudo ilusão

Que a vida só tem sentido pra quem ama a natureza

Que a ganância e a avareza

Corroem os sentimentos, com as armas do desamor.

 

Porém me sobra tão pouco

Nesse viver de lembranças

E só me resta a esperança que rebrotem nas coxilhas

Os ideais farroupilhas, com toda força e tenência

Para salvar a querência das injustiças sociais

Dando um exemplo aos demais

Pois somos a descendência da raça mais altaneira

Temos a herança guerreira

Dos charruas e minuanos

Nós somos republicanos, há pátria e nossa bandeira!!