Dos Sonhos Que Se Perderam

Sebastião Teixeira Corrêa

 

Extraviei meus sonhos nos confins dos anos

que, de tropa mansa, fez-se chimarrona,

viraram alçados, xucros, araganos,

com patas ligeiras de potra gaviona.

 

Na parede, ao gancho, pendurei os bastos,

sofrenei cansaços de uma vida dura,

estendi num caibro os aperos gastos,

memorial de um tempo em que sobrou fartura.

 

Recontei espigas no paiol de milho,

derrubei a cerca, para que o tordilho

buscasse seu rumo pela sesmaria.

 

Que não fosse ele mais um sem-destino,

pois é triste o fim para um viver teatino

quando não se tem nenhuma companhia.

 

Balanceei os cobres, as perdas e os lucros,

total, o que sobra não chega a um real,

quebrei tantos queixos de cavalos xucros,

então me pergunto, só isso afinal?

 

O meu abas-largas, já muito surrado

da chuva e do sol, tostado na lida,

pena de vê-lo, ali, pendurado,

sofrendo calado, num sopro de vida.

 

Faz nó na garganta quando olho as esporas,

alheias ao tempo e à marcha das horas,

erguidas num prego, tristonhas, silentes.

 

Me lembram histórias lavradas no lombos,

em lutas de domas, corcóvos e tombos,

quebrando corinchos de potros valentes.

           

Escuto o assovio do vento na frincha

roçando de leve as cordas do pinho,

e vejo a corruíra pousando na quincha

do rancho onde a ave fez casa e fez ninho.

 

Recordo os rebanhos de sonhos perdidos,

muito extraviados nos anos a fio,

um mundo de amores, que hoje esquecidos

deixaram-me o rancho e o peito vazio.

Então, viro o mate, e o amargo se amarga,

E os olhos se inundam e a voz já embarga,

campeio horizontes cá dentro de mim.

 

Encontro somente vestígios e rastros,

bandeiras de lutas pendidas dos mastros,

e um sol que declina, no rumo do fim.