NOS LIMITES DO MEU VERSO

Pedro Darci de Oliveira

 


Junto ao alpendre do rancho

diviso as cores do mundo.

 

Procuro firmar os olhos

numa poeira que se perde

entre a figueira e o céu.

Como aba de um chapéu

espalmo a mão sobre os olhos

e vejo assim, mais distante,

alargando o horizonte

deste meu mundo maior.

 

Distingo ao longe o revôo

das asas de um quero-quero.

Volteando a curva do cerro,

a sanga das pitangueiras

vai serpenteando no chão.

As léguas da sesmaria

levam junto a nostalgia

que me aperta o coração.

 

Por que será que a saudade

de quem partiu ontem cedo

faz o que fez no meu peito?

 

Porque será que a partida

produz este gosto amargo

de alguém que trocou de pouso?

 

Mas enfim esse é o caminho,

pra quem busca liberdade.

Que é um direito de ventre,

dos ventres, filhos do sul.

 

Dedilham no alambrado

os dedos do minuano,

como faz todos os anos

nas tardes de primavera.

Entre matizes das flores

timbram as asas ligeiras,

das cigarras cantadeiras

lá do “Rincão da Tapera”.

 

A tarde sangra no poente...

O Vento deita em açoites...

E a sorrir, o fim do dia

beijando a boca da noite.

 

Quando a boieira desperta

despertam sonos tranqüilos,

ampliando o canto dos grilos

que a noite grande pariu.

 

Um Urutau sorrateiro

num canto triste e, bonito

segue na noite solito

de contraponto com o rio.

 

Bem longe na madrugada,

vestindo plumas de aurora,

um galito acerta o tempo

na sinfonia de um canto.

Tenta orientar uma estrela

que se apartou do luzeiro,

para banhar-se nas águas

de uma lagoa de campo.

 

Quando eu me sinto pequeno

diante do quadro do mundo,

que nos faz ver bem no fundo

o sonho que se perdeu.

Que é tão sentida a saudade,

e infinitos, os desejos,

ante a aquarela de um beijo

pintada com a mão de Deus.

 

Tento a harmonia de um verso

ao som de um gole do mate

tamborilando no basto

sobre um banco no paiol.

Solfejo umas notas soltas

garimpando a melodia,

e ao raiar do novo dia

nasce uma clave de sol.

 

No manejo da cambona

eu risco a primeira barra,

como um solo de guitarra

da noite que vai voltar.

Mesmo sendo eu quem demarca

os limites do meu verso,

estes sonhos dispersos

aprenderam a voar.

 

E o novo dia campeiro

que chega dando um “oh-de-casa”,

ao som do ruflar de asas

de algum pássaro cantor,

mostra todo resplendor

da canção xucra do pago,

que traduz o Mate Amargo

num simples gesto de amor.