POR SER UM BALDE DE POÇO

Paulo de Freitas Mendonça

 

Por ser um balde de poço

que anda rangindo corda,

tenho sonho que transborda

rumo à água em alvoroço.

Neste balanço de moço,

descoberto e inseguro,

não sei em que me penduro,

se sou mesmo água limpa.

Vou ao fundo e volto à grimpa.

Fico entre claro e escuro.

 

Ás vezes subo e desço,

me batendo na parede,

amargando a própria sede

talvez por pagar o preço

do que não sei se mereço,

no entanto creio que aturo.

Me bato no bocal duro

ou mergulho no macio.

Por não ter nascido rio

Fico entre claro e escuro.

 

Sem regar o meu destino

num castelo sem janela,

obedeço a manivela

por um braço de menino.

Quando estou em desatino,

o silêncio desconjuro,

mas às vezes o procuro

para quebrar-lhe um pedaço.

Se no espelho me refaço,

Fico entre claro e escuro.

 

Mais que o seco e o molhado

dos cafundós do meu pampa,

não quero emborcar na tampa

de algum poço abandonado,

tampouco ser transformado

em vaso atrás de algum muro.

Num vai e vem sem futuro,

prefiro o topo e o fundo.

Já que não posso ir ao mundo,

Fico entre claro e escuro.