A Lança e a Flor

Paulo de Freitas Mendonça

 

Inverno finda e renasce

a flor na ponta do arbusto.

A matriz impõe um custo

que faz nascer o impasse.

Por não dar a outra face,

porque sofrer também cansa,

a tropa farrapa avança

e a rosa carnal em flor

esguicha quente sua cor

no extremo afiado da lança.

 

A cor de sangue da rosa

na adaga, lança e lenço,

o destemor é consenso

na fé da terra gloriosa.

Controvérsia misteriosa

Há entre lança e flor:

tirano e libertador

pra ambas possuem mão:

às vezes sangue ao irmão

e perfume ao traidor.

 

A flor não se contradiz

Por ter pétala e espinho,

ferir, fazendo carinho,

querer céu, terra e raiz.

A mesma que faz feliz,

dando sentido pra vida

traz a alma emudecida

quando falta a esperança,

embora não sendo lança,

leva o corpo em despedida.

 

Um taquaral caminhante

sustenta flores de tuna.

Esta é a imagem turuna

do soldado ao comandante.

Uma guerra alucinante

quando os botões do horror

desabrocham no pavor

de quem corpo-a-corpo luta

com intrínseca disputa

de quem quer ser o mais flor.

 

 

Onde acontece a batalha

mudam a cor, mal-me-queres.

Nas estâncias as mulheres

Sobre um fio de navalha,

temendo a lança falha

São senhoras e senhores.

A lança de opositores,

vinda de outro confim,

se invadir seu jardim,

por certo não ganha flores.

 

Esquecida aquela espera,

as lágrimas já enxutas,

homenagem às lutas

nesta nova primavera.

Plantam a vindoura era

Os gaúchos cultuadores,

herdeiros dos peleadores,

uma semente de paz

pro Rio Gande ser capaz

de um futuro só


 de flores.