DRAMA NA FAZENDA


Odilon Ramos

A tarde descambava, despacito,
Numa morosidade de boi manso;
O sol se encaminhava pro descanso
No seu acampamento na coxilha...
A gado percorria sua trilha
Cotidiana, no rumo do curral;
E ouvia-se cantar no matagal,
Um sabiá reunindo sua família.

No campo, um quero-quero solitário
Gritou sem que lhe dessem atenção,
E a coruja pousada no moirão,
Cantou baixinho, em tom de mau agouro
Nisso rompeu no casarão um choro,
Que pôs em alvoroço a peonada!
Era a patroa que, desesperada
Aos gritos, provocava aquele estouro!
A Rita, se sumiu a minha Rita!
Foi como jogar pedra em lixiguana...
E por cima um piá meio ventana,
Disse: “ o Florêncio não veio pro galpão”
E a peonada olhando pro patrão
Compreendeu o que tinha acontecido.. .
E o olhar do velho taura enfurecido,
Prenunciou que ia haver revolução...

A Rita era a relíquia da fazenda;
Um mimo de lindeza e de bondade,
Um toque de poesia e suavidade
Na vida rude em que ali se vivia,
Levantava cedinho todo o dia,
Mateava e conversava com a peonada.
Ela era tão querida e respeitada,
A Rita, logo a Rita quem diria!...

Florêncio era o mais guapo dos campeiros
Por isso foi nomeado capataz.
Já todos conheciam seu cartaz
Numa doma, no laço ou marcação.
Era estimado assim como um irmão...
E gostava da Rita, se sabia,
Mas nunca se pensou que fosse um dia,
Roubar tão logo a filha do patrão!

A voz forte cortou os pensamentos,
Como um trovão na tarde ensolarada!
Mandando se espalhar a peonada,
E que trouxessem os dois, mortos ou vivos!
E todos cavalgaram, pensativos,
Cada um por caminho diferente,
Cada um desejando, intimamente,
Não achar nunca o par de fugitivos...

A barra cor de rosa do sol posto,
Enfeitava ainda o céu lá no poente;
Soprava um vento morno, quase quente,
Um vento bom de tarde de verão...
De repente, ecoou lá no capão,
O estampido de um tiro, e outro mais!
E logo, o galopar dos animais
Dos peões buscando aquela direção...
Acharam os dois mortos, bem juntinhos,
A Rita e o Florêncio, lado a lado,
Misturando seu sangue derramado.
E a noite os encobriu com o seu véu.
Um peão mais velho tirando o chapéu,
Ajoelhou-se ao lado dos defuntos,
E pediu: “Meu Deus, recebe estes dois juntos”,
Nesta fazenda grande aí do céu”...