AS NOITES DO GUASSUPI

Autor: Moisés Silveira de Menezes


Com seu cortejo de sombras
a noite surpreende a tarde,
o aroma das primaveras
maçanilhas e alfazemas
preenche espaços vazios
entre o olhar e o sentir.
Linha fixa o horizonte
as vezes se achega mais
por outras dispara e para.
Se esgueirando vagarosa
a estrada parece estranha
entre o demais da paisagem.

Sonhos de muitos andores
no batente das porteiras,
moradas, naves solitas
na maré mansa dos campos.
Taperas em alvoroço
no imaginário da gente.
Não dorme nunca, não dorme,
vela o sono ao derredor,
aponta sempre o horizonte
de qualquer ponto de si,
a estrada é mundo de todos
ligando mundos dispersos. 

O rio estende a preguiça
desenhando no varzedo,
cinzelando com paciência
a face nua das rochas.
Se acalma na noite mansa
prá o passeio das estrelas
e para o banho da lua
que vai de um quarto prá outro
trocando sempre a roupagem
no afã de encantar o rio
onde se mira vaidosa
com seus fulgores de prata.

Aqui a noite se esgueira
não cai, apenas se chega
o dia também, não se vai
faz uma pausa em retiro
por detrás da serrania
e as vezes quando desperta
por sobre a crista dos cerros
há respingos de sereno
na face rubra da aurora
alguma nesga de negro
sobre o claro da alvorada
a noite parte “ al despacio
no vale do Guassupi.


 

As silhuetas dos cerros
recortadas contra o céu
parecem grandes fantasmas
sob o clarão da boieira.
Corujeiros, dois faróis
prescutam dentro da noite
varredura de rotina
vigilando a mataria.
Um sapo regente mor
rege uma orquestra maviosa
entoando canções antigas
em contra canto a dos grilos.

Quando as estrelas se ausentam
e a lua dorme mais cedo,
cá embaixo no grande vale
um lento acender e apagar,
procissão de vaga-lumes
com seu luzir andarilho.
Creio que andam na busca
de algo um tanto encantado,
talvez os baios- ruano
do negro do pastoreio
quem sabe, o rastro da moura
que se sumiu no Jarau.

Hora grande, madrugada
o silêncio encontra a noite.
O que se ouve, se cala
o que se move, se recolhe
só a brisa afaga os cachos
do arrozal em promessa
de oferenda silenciosa.
A cachoeira se reverte
não corre, se põe imóvel.
nessa hora a mão de Deus
se faz benção, proteção
o vale inteiro adormece.