COMO CHUVAS NUM CAFUNDÓ

Moacir D'Avila Severo

     

      A tarde passava ao tranco.

      Das nuvens um choro manso

      Ao despacito encharcava

      As paredes do aposento.

      Eu, de papo prá cima

      Sobre os pelegos no catre,

      Sorvia goles da "pura"

      Intercalando pensamentos.

      A fumaça do palheiro,

      Como rebanho de ovelhas,

      Enveredava prás frestas

      Repontada pelo vento.

 

      Num trotezito chasqueiro

      Se aproximavam lembranças

      Dos quebra-quebras de molas

      Com chinas que tive outrora.

      No teclado do zinco

      A chuva tocava, lenta,

      Uma milonga chorona

      Que até o tédio devora.

      Pois para um solitário

      Todos os palheiros são poucos,

      Um litro de canha é nada

      E os desejos não tem hora.

 

      Meu pensamento gaudério

      Só apartou de mim

      Quando batidas na porta

      Me despertaram, sem dó.

      Era café preto, quente,

      Bolinhos fritos na hora

      Trazidos por negra Odila

      Que, por feia, andava só...

      ... Mas passou a complemento

      Dos meus loucos pensamentos:

      - Dum garrão se faz filé

      Com chuvas num cafundó!