O PAYADOR E O RANCHO

Luiz Menezes

 

Passei a vida cantando

Como changueiro de tropa

De mil donos diferentes

E se fizeram rotinas

Pelo corredor da vida,

Muitas lutas sem vitórias

Deste velho payador.

 

E neste mutismo amargo,

Quanta lágrima escondi...

 

Sempre rumo do horizonte

Buscando do outro lado

O povoado da esperança,

Eu me perdi nos amores

Que tomei como remédio

Pra o delírio solitário

De quem sabe cantar.

 

Fiz da lua meu candieiro

Para iluminar a insônia

Da negra meditação...

 

E me derramei em versos

Que é o universo da dor...

Escutei no meu silêncio

Cá bem dentro do meu peito,

Todas as revoltas do mundo

Deste meu mundo interior.

 

Mas nunca contei aos outros

Quão duro foram os caminhos

Por onde um dia eu tropiei...

Bandeei a nado os arroios

Que se interpuseram à ânsia,

Que sempre tive em chegar.

 

E nos fogões galponeiros

Cantei a luz dos brazedos

Para esconder neste canto

Toda angustia do cantor...

 

E neste mutismo amargo

Quanta lágrima escondi...

 

Mas jamais me dera conta

Que de meu lado, seguia

Passo a passo, hora a hora

Ao trotezito calado

O mais velho dos tropeiros:

O tempo tropeiro... O tempo!

 

Um dia cheguei à sombra,

De um cinamomo distante

E achei que era o momento

De erguer meu rancho afinal.

Seria meu fim de estrada!

Meu verso, fecho de estaria...

Seria afinal a glória

De quem só soube cantar...

 

Mas de repente o destino

Como um amigo gaudério,

Vem me fazer um convite

Pra tudo recomeçar.

 

Só que não viu do meu lado

Como um cusco enrodilhado

O tempo, velho e cansado

Me pedindo pra parar

 

Olhei pra o rancho em silêncio

Depois pra estrada distante,

Por onde um dia eu cheguei...

Me parecia mentira,

Que eu teria que seguir,

Foi quando o tempo falou:

 

Deixem ficar este velho,

Não lhe obriguem a caminhada

Está cansado demais.

Não lhe tirem da ramada

Seu recanto nostalgia

Da solitária alegria

De seu silêncio escutar.

 

Deixem ficar esse velho

À sombra do rancho tosco,

Que ele barreou com afeto

E quinchou com emoção,

Cada pedra, cada planta,

È um verso que se levanta

Na forma de uma canção.

 

Deixem ficar esse velho,

À  sombra do que ele amou,

Seu rancho glória dos versos,

Dos cantos que ele cantou.

 

Deixem morrer este velho,

Como morre um payador,

Ouvindo de um cinamomo,

Outro pássaro cantor...