VELHA ESTÂNCIA MODERNA

Luis Lopes de Souza

 

Um clarão...

arregaçou as pupilas

de quem fazia retorno,

rasteando o vestígio amargo

por onde um dia se foi

campeando sonhos de moço...

 

Era ali...

 

Com olhar incrédulo e imenso

numa frustrada saudade,

soletrou os desenganos

no portal de letras grandes

sobre a antiga porteira,

um misto de,  luxo querenciano

e simplicidade povoeira,

onde o progresso voraz

arquitetou nova estampa

num atavismo fugaz...

 

...restava o nome avoengo

entre lajes de concreto;

num apogeu modernista

engenhado pelos netos...

 

...nos campos de gado e vento

plantaram cercas elétricas,

as antigas de aboio

perderam toadas e métricas...

Pajonais foram sugados

pelos canais drenadores,

e o terrunho ficou surdo

nos decibéis dos motores...

...a estância virou cabanha

ou fabriqueta de cria,

calou-se o berro do touro

com minguada serventia...

tudo foi remodelado

por rabiscos de doutores,

e há réstias de grandes lumes

no ronco dos geradores.

 

Entre as marcas centenárias

da mangueira e do galpão

levantaram alicerces

de uma luxuosa mansão...

a mais perfeita vitrine

do perfil aristocrata,

onde um gaúcho mateia

refugiado na gravata...

 

...foram, moldando a querência

com artefatos grã-fino,

o artificial iludiu

com recatos citadinos...

Hoje, o micro reproduz

até o relincho dos fletes,

numa cópia da estância

inserida nos disquetes...

 

Estância?

È chamada de estância

mas não é a velha estância!

Aqui, até peão mudou a postura,

o espelho do açude

reflete um gaúcho rude

de celular na cintura...

 

Há gemidos de ancestrais

brotando na argamassa,

sufocando suas raízes

e a identidade da raça...

 

Se, o patriarca terrunho

um dia também voltasse,

seria um vago estranho

na querência que plantou.

Gritaria um “Ô de casa”

no portal de letras grandes

e, indagaria com ânsia!

Pelo atalho mais curto

no rumo da velha estância!