A CELA

Luis Lopes de Souza

 

Aqui o tempo não urge a consciência me sepulta

no mofo da solidão,

como a larva do repúdio

ruminando a realidade

no abismo do seu casulo.

Aqui o remorso se propaga

moldado pela marreta

que esmaga a polpa do erro

contra a bigorna da dor.

 

Eu que adubei cobiça usando mãos alheias

num agrário pago que quis só para mim,

plantei sementes viçosas e impuras

pra regar lavouras louras de pecados

e colher safras injustas de fartura...

Acumulei riqueza nas arrobas da

balança

e o orgulho tomou conta da seara

no eito fértil de minha ignorância...!

 

Aqui as honras se arrastam

num vazio alucinante,

confinando a rebeldia

na masmorra da demência...

Aqui a vida se nutre

no escarro do silêncio

com evidente abundância

no oco impune da culpa...

 

Eu que soberano no trono de um puro

sangue

castiguei os maturrangos com puas de

indiferença,

entropilhei fortunas alçadas e velhacas

e larguei por refugo a humildade e a

clemência...

Sesmeiro poderoso criei redomões e

egoísmo

indomável na luxúria e na ganância,

corruptei aporreados na força e na

“plata”

pra nem um corcovo planchar minha

arrogância...!

 

Aqui o terror se agranda

entre a grade imaginária

e a clareza dos porquês,

uma legião de fantasmas

se revezam persistentes

rondando a alma da gente...

 

Aqui a vida sucumbe

e a morte é tão tentadora

que convence certamente

ser urgente e necessária...

 

Eu que transgredi caminhos carreteando cifras

pra surtir de ouro ambições dolosas,

fraudei tambeiros pra exibir riquezas

no gemido tosco de cambotas pobres.

Eu que enchi bruacas de razões errôneas

pra tropear cargueiros em dimensões só

minhas.

... comprei prestígio e poderio de nobre

e zombei daquele despilchado “solo”

que fomulento me implorava um cobre...!

 

Sim errei...!

Mais do que um erro um pecado...

 

Sei que não basta me redimir no desterro

estou recluso nas grades do próprio erro

cá nesta cela me vejo contrito e brando...

Como errante sei que sou imperdoável

um quase nada, moribundo, miserável

que certamente segue pecando e pecando...!