O Retratista

Matias Moura e Luciano Salerno 

 

O silêncio ecoa na hora calma... 

O cerne de espinilho reacende  

Quando atiço seus rubores

E um galito infla o peito pra saudar um novo dia...

Pra os olhos ariscos, que buscam imagens,

A porta do galpão é moldura

Para o céu que, ao longe,

Divide o verde da paisagem.

 

Vislumbro este quadro palanqueado no olhar,

Campo e querência guardados há anos.

 

O arrebol matiza e a sinfonia, matinal, apresenta

Singelas notas pra o coração de quem sabe escutar.

Ao palmear um mate vejo o quanto a vida é pura

- vertente de poesia

Frente aos olhos de quem sonha;

 

Eu enxergo... Tuas cores e sinto teus aromas!

Quanto ela...!? Tem a nos oferecer?

Muito...! E não nos cobra nada!

Tenho olhos de outro tempo

Que não cansaram de enxergar limites

Na mesma vida pintada pelos poetas

Passando, pelo olhar do mundo, despercebido.

 

E ainda há os que fecham os olhos

Em descrença a estes momentos eternos

Que, no andejar das horas, não voltam mais!

Pobres de alma e insanos de coração!

 

Assim, vez por outra,

A alma encilha um flete bueno,

Desses de vencer lonjuras...!

Saio a recorrer campo

Onde um picaço e um tordilho,

Buenos de patas e mansos de arreio,

Pastam perto da sanga, na quietude de seu mundo;

 

Na ponta de um moirão,

Onde a divisa se alonga, um barreiro fez morada...

...“a lo largo” a passarada em revoada

 Ensaia um cantopara depois pousar

Nos braços estendidos de um cinamomo,

Neste simples palco...

Onde a arte viva do campo se expressa!

 

 Segue o dia...

Na volta do corredor, num tranco lento,

A alma busca refúgio pelo cansaço de estradear!

 

Volto ao rancho... E as retinas,

Povoadas com estas cenas que guardo,

São emolduradas, qual retratos,

Nas paredes do olhar!

- que linda a vida na sina de campeador!

No galpão do pensamento estas rudes imagens,

- que antes eu mirava pelas janelas do tempo,

Entre um mate e outro nas horas quietas -

Fizeram-me entender o verdadeiro -sentir-...!

 

Hoje percebo o quanto andei retratando meus dias...

A vida em seus momentos singelos,

Registrados no meu tempo...

Os semblantes parados, sorrisos amarelados

Habitando cenas de campo e alma...

Que estamparam a querência!

 

Em meus olhos retratistas,

Lindas são as cores da vida,

Que registro o pouco do muito de nossa gente

E me fiz voz pelas imagens

Guardadas de um bem querer,

Para os que virão completar o ciclo...

Nascer, viver e morrer!

 

Sei que me tornarei saudade

Quando na parede do galpão,

Em moldura, eternizado, me fizerem de vigia...

...mateando num outono, com este sorriso largo

E olhos ariscos campeando imagens,

Eternizando as paisagens da minha querência,

Prolongando a existência de tudo que ainda é meu!