Raízes do Tempo Antigo

Lauro A. C. Simões

Alpargata a meio-pé!

Costuradas com arame de quinchar ranchos!

Um chapéu de abas derruídas

- num barbicacho de barbante - preso a nuca!

Na bombacha de riscado e já puída

o desenho dos cerzidos de outros pêlos!

Na voz, as ressonâncias bem timbradas

de quem conhece o mundo e leva a vida!

 

Todos os dias, passos largos nas calçadas!

Uma cesta de vime, já sebruna pelo tempo

e um grito que soltava, qual "mandado":

- óia o jujo!

- Hay arnica, marcela, cancorosa!...

E, desse jeito, negaceava alguma prosa

pra aviar uma receita à moda antiga

com os manojos que ofertava, bem atados!

 

Quase sempre, nas janelas,

com mate recém-cevado

os velhos, vinham à rua

comprar algum manojito

que misturavam na erva...

que anda de gosto esquisito!...

Pura desculpa, essa a deles

pra porem no mate-amargo

as folhas medicinais

da flora xucra do pago!

 

Sim!...

Há uma aura de confiança,

nessa figura tão rude!

- Se confia o próprio filho

à medicina campeira

de mel, de um guaco, e do agrião...

que ele colheu num açude!

 

Todos lhe guardam confiança

e a fé remove montanhas!

Por isso, nos vilarejos

perdidos pela campanha

ainda se encontram jujeiros!

A quase extinta figura

que não faz muito, no tempo

miticavam dores brabas

com ervas e benzeduras!

 

Sim!...

Os mais velhos continuavam

com seus mates temperados

- iguais aos pais de seus pais -

Como um eterno legado!

 

Esses humildes doutores na medicina campestre!

Homens, vindos dos agrestes, junto ao clarear o dia!

Até parece mentira, mais quantos...tantos e tantos

enxugaram fartos prantos, nessa xucra homeopatia!

Sim!...

Ainda que novo eu seja, acredito com firmeza

num chazito de carqueja, depois de um churrasco gordo!

Quem sabe, foi-me legada, essa confiança terrunha

que eu mesmo sou testemunha, da força da natureza!

 

Talvez, seja o misticismo - o que nem eu acredito -

Desses homens, sem estampa...sem gravata e paletó,

infundirem tão profundas a confiança e a certeza

Nesses bens da natureza que nos vem desde os avós!

Sim!...

São eles pelas ruas - de bombacha arremangada -

Com seus gritos bem timbrados e as prosas porta a porta!

Com suas cestas de vime - já sebrunas pelo tempo -

e os xucros medicamentos no refrão que nos conforta:

- óia o jujo!

- Hay arnica, marcela, cancorosa!...

 

Vão escasseando esses homens!

Inté no povo, onde vivo

não sobrou um pra remédio

das dores brabas da gente!

Ninguém é Deus, certamente,

mas pra um homem campeiro

ajuda grande esta fé

num chá bem forte, caseiro!

 

Mil gracias à ciência andeja,

Sempre buscando caminhos!

A humanidade precisa

e nós, xirús campeiros

(vemos o esforço pras curas)

mas igual, uma carqueja

ao menos lembra a figura

antes do fim...dos jujeiros!