Potros de Luz

Júlio Cezar Paim

 

 

Todos nascem livres!...

-Eis o maior direito de todo ser vivo,

desde a primeira constituição do mundo.

 

No entanto,

nem sempre é dado aos libertos

o direito de escolher, onde serão livres...

A liberdade de alguns é tão ampla

quanto o horizonte verde-azul de seus olhos.

Outros, só se dão conta que são livres

quando a porteira do corredor é fechada,

embretando-os na invernada grande

e estreita, que leva às selvas de pedra.

 

Quantas vilas morreram no interior

pra formar esses aglomerados urbanos

que crescem a galope, e ganharam a condição

de grandiosas metrópoles,

que de grande mesmo tenham, talvez,

uma que outra alma de campo e flor...

 

Hoje é outro tranco do tempo!

Adeus aos domingo s de carreirada onde,

ao fim das tardes, com cheiro de terra pós-chuva

romances eram escritos apenas nos olhos

do moço e da moça bonita de flor no cabelo!...

 

As carreiradas de agora tem outro sentido.

Talvez sejam contra o relógio,

por mais tempo sem o que fazer.

É, pois, baio-sujo o pêlo.

E mais ligeiro que um raio

o cavalo nosso de cada dia...

As horas (senhoras do tempo atual)

não têm mais tempo de andar a cavalo!...

 

Todos nascem livres!...

Sempre existiram cavalos mansos

e homens que se deixaram cabrestear...

Mas nem todo homem aceita cabresto de prata

e há muitos potros que se deixam domar!...

 

Alguns são de instinto bárbaro

e só se deixam montar, orelhados, e por alguns segundos,

para que o ginete tenha a sensação de senhor do mundo...

Só no lombo de um aporreado

um homem chega mais perto de Deus!...

 

Lá de cima tudo é tão sublime.

Mas do ápice do lombo ao chão é tão rápido

quanto um pássaro se libertando de nossas mãos...

Se o domador beija a grama só com a crina de consolo

o cavalo sempre pula por cima pra não machucar o peão.

 

Pena que o homem ainda não tenha entendido

que é preciso cair pra descobrir a origem de tudo...

...tudo vem da terra. Que é ventre, semente, raiz...

...vertente em si mesma, motivo maior pra alguém levantar.

E somente quando cai o domador beija a Terra Mãe

e se encontra consigo mesmo...

 

Talvez aí esteja a razão

Da rebeldia dos aporreados diante dos orelhadores.

Os cavalos “de a muito” sabem que

a liberdade é sua razão de viver. Ser livre é sua missão.

 

Por isso, ao deixar o domador pra trás,

os animais xucros parecem querer voar

pra não pisar a grama e a florzinha do campo...

Andam igual aos que tem o coração alado...

...flutuam entre as nuvens verde-azuis do pampa,

tocando com as pontinhas dos cascos o solo

e tirando dele a mais sublime sinfonia de amor ao Chão...

...são os potros de luz

que se vão, livres, rumo às estrelas!...

...onde as puras almas do campo

e aquelas que não se deixaram domar

se encontram para contemplar os mistérios da criação.