Rancho Velho

Juca Ruivo (José da Silva Leal Filho)

 

Entre umbus e sina-sinas,

em meio a pedras erguida,

no descampado esquecida

como saudade passada,

completamente cercada

pelo trevo e a flexilha,

onde a flor da maçanilha

veste o chão na Primavera,

está uma triste tapera

topejando uma coxilha.

 

Aí nesse chão bendito

que tanto segredo encerra,

sagrado palmo de terra

do verde pampa infinito,

aonde em estranho rito

se assiste à missa da aurora,

onde a madrugada chora

em lágrimas de sereno,

aí nesse berço ameno

foi que surgi para a vida.

 

Foi onde senti os anseios

do sangue da minha gente.

Onde fui Caudilho à frente

de esquadrões de fantasia;

onde em noites de invernia

sonhei sonhos de ventura;

onde solto na planura

penetrei-lhe no segredo,

sem saber que muito cedo

tudo em sonhos ficaria.

 

Essas fundas cicatrizes

que o tempo te abriu nos flancos;

esses teus cabelos brancos,

restos de antigas raízes;

os nostálgicos matizes

que o sol crioulo te imprime,

tapera, — meu ser exprime

com perfeita identidade...

Tapera, — minha saudade

que jamais esquecerei!

 

Assim também como tu

rancho velho abandonado,

eu carrego no meu fado,

teu escombro triste e nu.

Meu coração é um umbu

cheio de “marcas”  antigas,

gravadas por mãos amigas

de Gaúchos de igual sina...

 

Minh’alma é uma sina-sina

broqueada pelas formigas.

*

*  *

Tapera da minha infância!

Descansa na tua coxilha,

nessa tumba de flexilha

sem temor do esquecimento;

pois dentro em meu pensamento

encontrarás um abrigo.

E pra que haja um testigo

que te conserve a lembrança,

eu serei sempre criança

para estar junto contigo.