QUANDO EU VOLVER

Juca Ruivo (Jose da Silva leal Filho)

 

Quando eu volver para o meu pago, um dia,

e ouvir de novo a glória da querência

na cordeona do pássaro gaúcho,

encarnarei, — por tão curtida ausência -,

as mesmas sensações de nostalgia

que sofrem os caudilhos emigrados,

conduzindo por Nortes indecisos,

destroços de encontros mal peleados.

 

E volverei... como tantos outros

piazotes, gaudérios e monarcas,

guasqueados pela mão de sina ingrata

que mui temprano vão tropear a vida;

quarteando uma esperança em cada pata

do bagual regalado, — pra ajudar...

 

— Minha mala de poncho será chica

pra acomodar as roxas e os recuerdos

— que o sinuelo trazido enquadrilhou;

 

e, talvez, seja o único que toque,

em paga dos meus dias mal vividos,

ao trote do meu flete por delante,

quando volver ao chão que me criou.

*

*    *

Não sei o que serei, al fim,

quando bater para a querência, um dia;

e nem se a profecia

daquele velho guasca guerrilheiro,

que sacava em gesto largo do sombreiro

quando falava de Osório e Canabarro,

se cumprirá al final;

 

ou se será real,

o que ele futurou seguro,

na madrugada em que saí chorando,

um choro parado, — de vergonha de chorar, -

na bisonha coragem dos meus doze anos;

 

entre paisanos,

que me bombeavam firmes, — pra animar...

e o vulto flaco do meu cusco baio

que ficou me olhando, de soslaio,

olhando num olhar de quem entende...

 

Se o que ele sentenciou

daria certo:

 

Muchacho lindo pra tourear a sorte!

Tem brado d’armas; — vai dar um figurão;

a cria agora não negou;

vai ser um Taita cá neste Rincão!

 

Pouco me importa o que serei, al cabo,

De qualquer jeito, mouro e despirchado

apearei no oitão do velho rancho.

 

Não na “alegria”  dos abichornados,

que buscam retovar com o pala fino,

trapos e penas, em risos contrafeitos;

 

mas bolearei a perna rindo ancho,

a risada dos guascas satisfeitos,

que já deram peleia pro destino.

 

Depois, no cemitério do Rincão,

espalharei as sempre-vivas da lembrança,

que na vida haragana entropilhei;

 

campeando o parador duma saudade

que mui tristonha lá ficou plantada,

terei bem paga a vida já tropeada,

se achar alguma das que ali deixei.

 

E aos manes do profeta gauchesco

erguerei, na cova onde jazer, —

uma cruz falquejada em cerne duro,

que dure a pena que carrego em mim,

por tudo aquilo que eu não pude ser.