NOITES DE INVERNO

Juca Ruivo (Jose da Silva Leal Filho)

Como esperança de pobre,

que nem estrada real,

são compridas, por igual,

as tristes noites de inverno...

 

Meu rancho é todo de prata,

porque num furo da quincha

o luar entra em chispaços!

 

E pelas juntas e frinchas

dos torrões de pau a pique,

o vento passa zunindo

lembrando guasquear de laços.

 

Solito com meus penares

forcejo pra cochilar;

escuto o leve roçar

do ramerio da ramada,

onde, de certo, a geada,

seu poncho branco estendeu.

 

Dentro da noite velha

vão galos amiudando.

 

São as guitarras da madrugada

que estão floreando...

 

Olho pra dentro de mim

e charlo com o pensamento;

 

na fumaça do meu baio,

misturam-se no momento,

visões que passam num raio,

atropeladas em bando;

 

Guascas de calça e perneiras,

em pilungos enfeitados

com boleadeiras,

sem ter mais, o que bolear...

 

Potrilhos tomando vinho,

redomoneados

por um gringuinho,

que monta pelo lado de laçar...

 

Tropeiros em automóvel,

engravatados,

apartam gados

batizados como gente...

 

 

 

 

Cruza agourenta uma coruja;

berra um sorro teatino na canhada;

ouço o rufo das patas duma eguada

agrandando o mistério da coxilha.

 

Meu cusco se desenrodilha.

Bate a cola no portal enluarado

e começa a rosnar para o silêncio

como se algo enxergasse, apavorado,

o que olhos humanos não enxergam...

 

Quem sabe; — alguma alma penada

rogando por velas e orações.

 

Epa! Amigo - despacito;

Não é reiúno o potreiro

nem de viúva o que encerra.

Hai dono pra quem se dê,

um Deus te Salve, — a lo menos;

 

É tudo várzea, amigaço,

pra mim e pra o meu picaço;

Não hai cerca que me ataque

nem porteira bem fechada.

 

Ando tropeando lembranças

pra negociar nas balanças

da Charqueada da Ilusão...

 

Não botou tento paisano?

Sou Blau Nunes recordando

noite igual, de antigamente!

 

Não te grudes às tuas prichas;

Fixate no meu conselho;

inda vais ver neste pago,

o Guasca apanhar de relho.

 

Bombeia o que vem de tiro.

Vai dar bom peso Patrício!

Paga bem o sacrifício

de andar tropeando alta noite.

 

Me fixei no maneador

do tropeiro da Ilusão.

 

Na ponta vinha a cabresto,

enlaçada em focinheira,

a maior prenda campeira,

o vulto da Tradição.